Magia do caos

Servidores

De forma geral, um servidor é uma entidade construída por um ou mais magistas com objetivo específico, e que pode ser usada por um ou mais magistas que desejem este objetivo. Muitas vezes, a criação de servidores é baseada em contratos escritos, mas existem métodos de criação que utilizam apenas a canalização das energias desejadas.

Em termos de funcionalidade, de fato, os servidores se assemelham muito a outros tipos de entidades. Dessa forma, a prática de criação e utilização de servidores pode ser realizada de forma mais produtiva caso sejam entendidas as diferenças e as semelhanças com estes outros tipos.

Tipos de Entidades

As descrições documentadas acerca dos tipos de entidades não são tão fixas e rígidas como parecem. Ao longo do tempo, as palavras foram re-significadas, adaptadas, e novas definições foram sendo acrescentadas, enquanto outras caíram em desuso. Porém, é importante que se tenha uma ideia das diferenças e semelhanças entre os servidores e outros tipos de entidades, para seu uso da forma mais vantajosa possível.

  • Divindades: geralmente este termo se aplica a energias que foram personificadas ao longo dos séculos na forma de deuses, semideuses, Devas, Anunakis, ou outras nomenclaturas possíveis. Estão relacionados a aspectos naturais, mentais, espirituais, físicos ou energéticos, e para que uma entidade alcance este nível esta deve ser conhecida por um grupo, sociedade, etnia ou cultura, podendo ou não ser cultuada. Pelo caráter cultural, esta classificação geralmente se aplica a entidades mais antigas, que sobreviveram à passagem do tempo e foram sendo passadas entre as gerações — o que não é o caso, ainda, dos servidores mais recentes, devido à sua baixa (porém crescente) publicidade, e a seu poder limitado.
Imagem: Adam Warlock and Cosmic Entities
  • Espíritos: são entidades que habitam os planos espirituais, por vezes também sendo acessíveis no plano astral ou etérico, e consistem nas almas de pessoas que não estão encarnadas. De forma mais geral, o termo pode se aplicar a energias diversas que habitam nestes planos. Os espíritos podem ser atraídos pelo magista, mas de forma geral não são criados por ele de forma consciente, como os servidores. No espiritismo, podem ser almas humanas desencarnadas, no budismo podem ser espíritos famintos ou habitantes dos infernos de tormento, e na mitologia moderna ocidental podem ser entendidos também nessa categorias as assombrações ou fantasmas. Na Magia do Caos são muito citados os obsessores, que são conceitos importados de outros Sistemas como a ideia de espíritos parasitas astrais que se alimentam de obsessões que geramos em nós.
  • Santos e Heróis: no Cristianismo, os Santos são associados a pessoas que realmente viveram, embora seus feitos possam ter sido distorcidos e exagerados ao longo dos séculos, ou ainda descritos de forma metafórica. A história de vida “oficial” de cada um dos santos católicos, por exemplo, pode ser consultada nos arquivos do Vaticano, e algumas delas estão disponíveis na internet. Na cultura nórdica antiga, alguns heróis mortos eram reverenciados e usados de inspiração, como homens que habitavam aquele momento o Valhalla, era um incentivo para os guerreiros vikings lutarem suas batalhas. Na Grécia Antiga também pode se entender os heróis como personificações santificadas pela cultura guerreira dos helênicos, que conduziu boa parte da cultura de formação moral e ética daquele povo. As energias dos Santos e dos Heróis são atraídas de forma a obter as graças que estas pessoas teriam realizado em vida, embora muitas destas graças possam ter sido imputadas a eles posteriormente, não sendo baseadas em fatos. A diferença básica para os servidores seria o fato de os santos e os heróis não terem sido criados por um magista, mas sim registrados pela instituição eclesiástica (inclusive com procedimentos específicos envolvidos na beatificação) ou pela tradição oral e escrita, além do fato de acreditarem-se terem vivido como pessoas reais, e realizado tais feitos.
Imagem: DC Abstract Entities-Time-The Sandman — Overture #4 (2015) — Page 6
  • Eidolons e Dæmons na Grécia: na cultura grega, acreditava-se que os humanos que morriam de forma heróica se tornavam Daemons, podendo migrar entre a superfície e o subsolo da Terra, servindo de intermediários entre os humanos e os Deuses. Já os humanos que morriam de velhice se tornavam Eidolons, vagando eternamente no Hades sem personalidade e com expressão vazia. A função dos Daemons como intermediários entre os humanos e os Deuses pode ser associada à realização de desejos dos magistas pelos servidores (na cultura árabe, inclusive, estas entidades foram descritas como Gênios ou Djinns), porém sua criação independe da vontade de um magista, o que é uma diferença crucial para fins de classificação.
  • Asuras e Devas na Índia e China: Em uma cosmovisão muito diferente das referências ocidentais, nos dois reinos mais elevados do Samsara, dentre os 6 reinos do budismo, existem duas categorias de entidades que nada se assemelham com espíritos ou humanos. Os Asuras são como entidades guerreiras de extremo poder e longevidade, que vivem embebidos de bonanças e orgulho. Seriam análogos a demônios em uma visão simplista de suas manifestações mitológicas (seres vermelhos, imensos, com fogo saindo das ventas), mas Asura em Páli significa “antideus”, ou como se fossem deuses egoístas que não trabalham para ajudar ou conduzir a humanidade, senão conduzir seus próprios desejos e conquistas e glórias. Já os Devas seriam o mais próximo de anjos na cosmogonia Hindu, seriam como seres sencientes de vários níveis e camadas (desde seres físicos que se alimentam e dormem, até feitos de pura luz que se alimentam de sua própria emanação). Eles seriam seres que acumularam um carma tão positivo que em uma encarnação nasceram plenos de todos os prazeres que podem receber no universo. Servem às vezes como guias mas em geral nem se dão conta da existência humana, tão grande é sua glória e sua liberdade. Embora complexa, caso a evocação destes seres seja bem sucedida, estes poderiam conceder pedidos com finalidades de dispersão e evolução (no caso dos Asuras) ou concentração e manutenção (no caso dos Devas).
  • Shinigamis e Onis: na mitologia xintoísta, existem duas classes de entidades que não possuem correspondência direta no panteão espiritual ocidental. Os Onis são como os “demônios” na forma mais bestial, são criaturas malignas, mas que serviam dentro dos propósitos de fábulas japonesas sobre as consequências da má criação das crianças. Eram como monstros que comiam almas. Já os Shinigamis seriam equivalentes ao ceifeiro das lendas europeias, ou deus da morte, as entidades que vinham para levar as almas dos homens e conduzi-las ao lugar que pertenciam de acordo com o resultado de seus atos na Terra. Podem ser evocados e suas características podem ser atraídas pelo magista, mas como no caso das divindades já possuíam existência própria, estando previamente relacionados a alguns aspectos do Cosmos.
Imagem: modelo de contrato com o Demônio Padiel (em Skinner e Rankine — The Goetia of Dr. Rudd).
  • Demônios e Anjos: as emanações das energias de dispersão e de evolução e das energias de concentração e manutenção foram personificadas há longo de milênios como anjos e demônios. Possuem diversas hierarquias e níveis de poder, podendo estar associados também a planetas, horas, dias, direções cardeais e elementos alquímicos. São descritos em diversos grimórios, principalmente nos cinco livros de Magia Salomônica que compõem o Lemegeton. Os mais famosos dentre os demônios e anjos de menor hierarquia são os 72 Daemons da Goécia e os 72ShemHamPhorash correspondentes, que por estarem mais próximos dos humanos podem ser evocados de forma mais direta. Estas entidades foram evocadas e compiladas por diversos magistas, mas os relatos aos quais se tem acesso indicam que possuíam existência própria, não sendo criados como os servidores. De qualquer forma, como os servidores, cada um possui características próprias, podendo ser escolhido o melhor Daemon ou ShemHamPhorash para cada objetivo a ser alcançado.

No Compêndio de Magia Salomônica do Dr. Rudd, é apresentado um modelo de contrato com um demônio, permitindo observar que, na época que o livro foi escrito (por volta de 1650), já havia uma preocupação em limitar-se a atuação das entidades, para evitar ações indesejadas.

  • Familiares e Animais Totêmicos: os familiares animais são usados por feiticeiros e citados em diversos tratados sobre magia, principalmente os de origem europeia e os da época medieval. Tratam-se de animais que auxiliavam o magista em suas práticas, tendo existência física como animais, mas com características mágicas, e podendo em alguns casos se comunicar com o magista. Neste caso, a consciência mágica pertence ao próprio animal, que também é o veículo para a energia, e ele possui atuação independente do magista, sem limitar-se a apenas uma atividade. Ao contrário dos familiares, os animais totêmicos não possuem existência física (embora possam aparecer no mundo físico como sinais ou avisos). São guias astrais que correspondem a forças primordiais do inconsciente do magista, e se aliam a ele em sua jornada. Uma classe de entidades similares é a dos Familiares Espirituais, espíritos que são comandados por uma força superior para seguirem um magista e auxiliá-lo em suas práticas. Apesar de terem o mesmo caráter auxiliar dos servidores, considera-se que possuem existência independente do magista, não sendo criados conscientemente pelo mesmo, mas sim sendo atraídos por afinidade de frequências.
  • Elementais Naturais, Homúnculos e Golems: na Alquimia, são citados diversos rituais para atrair elementais, que são seres relacionados aos elementos e que existem naturalmente no plano astral — os principais são os duendes e gnomos (terra), os silfos e fadas (ar), as ondinas (água) e as salamandras (fogo). Estes elementais são correspondentes a estados mentais específicos, e podem influenciar o magista ou outras pessoas. Os Homúnculos e os Golems (estes últimos também utilizados na magia judaica) seriam entidades criadas pelo próprio magista. Nesse sentido, um golem seria um corpo físico, criado artificialmente (de metal, barro ou madeira) que foi animado por meio de um ritual, e pode fazer tarefas para o magista. Já um homúnculo seria um elemental artificial criado pela prática alquímica (mas geralmente com base em uma substância física, como sêmen ou metais), e que vive no plano astral — observa-se grande semelhança com os servidores modernos.
Imagem: Giulio Romano c. 1532–1534 The Assembly of Gods Around Jupiter’s Throne Sala dei Giganti.
  • Tulpas e Formas-Pensamento: na Magia Tibetana, as Tulpas (derivadas do termo “sprul-ba” — emanar algo de forma proposital) são criadas mediante forte intenção e concentração, por meio de práticas direcionadas. Podem seguir o magista, e algumas podem mesmo ser vistas por outras pessoas. As Formas-Pensamento estudadas na Teosofia são um tipo mais geral de manifestação, podendo ser relativas a objetos inanimados ou a entidades animadas. O conceito de Tulpa foi distorcido ao ser transposto para o Ocidente, mas de forma geral as Tulpas e as Formas-Pensamento se assemelham muito a servidores, diferindo apenas nas práticas específicas de criação, e nas limitações impostas.
  • Parasitas Astrais: de forma geral, é entendido que algumas entidades, com existência independente ou criadas por magistas, podem se alimentar de energias psíquicas, um fenômeno chamado de parasitismo — ressalte-se que o termo “vampirização” não seria o mais correto para tal, uma vez que por “vampiro” atualmente se definem algumas vertentes mais modernas de magia que não têm a ver com parasitismo energético. Um exemplo de parasitismo pode ser visto em relação às Lendas Urbanas, que de tanto serem incutidas no inconsciente coletivo passam a ser vistas por pessoas em momentos de vulnerabilidade, cansaço, sonolência ou estresse. Quando se alimentam do medo, estes parasitas vêm sendo inclusive chamados de “Tulpas” (termo utilizado como corruptela, e somente em uma visão Ocidental, muito diferente do conceito original, Oriental, de Tulpa). A diferença básica para os servidores, neste caso, é que a alimentação energética dos servidores é controlada e ocorre sempre de forma proposital pelo magista — desde que bem estabelecida no momento de sua criação — e não de forma predatória ou descontrolada.
  • Mônadas: no gnosticismo existe o conceito de uma essência que está ligada a todas as almas sencientes, e essa essência pode se manifestar como uma entidade semelhante a um homúnculo, uma criatura humanoide minúscula feita de luz e linguagem. Essas entidades têm uma descrição semelhante na experiência com DMT do psiconauta Terence Mckenna, como pertencentes a uma dimensão feita de linguagem e muito mais evoluída que a nossa. Para Samael Aun Weor, todos nos tornamos mônadas após 108 vidas humanas sem alcançar a iluminação, e este seria o motivo do número de contas no colar de Buda. De forma geral, as mônadas possuem existência independente do magista, e não são criadas propositalmente, mas podem ser atraídas e utilizadas para os mesmos fins que os servidores.

Elementais Artificiais na Golden Dawn

Imagem: o Alquimista Enrique de Villena criando um homúnculo.

Na Golden Dawn, cada um dos membros se aperfeiçoou em um conjunto de sistemas mágicos, e neste contexto, por volta de 1910, a magista Dion Fortune desenvolveu, com base em diversos sistemas mágicos antigos, dentre eles a Alquimia, seu método de criação de elementais artificiais. Os elementais surgiam como formas-pensamento, mediante forte intenção e propósito, sendo moldados pelas forças psíquicas do magista e realizando atividades pré-determinadas.

Estes seres construtos possuíam um caráter similar ao de várias classes de entidades, como as que foram descritas anteriormente, e as formas utilizadas para sua criação eram próximas às da Teosofia e às da Magia Tibetana. Fortune alegava, no caso, ter criado um elemental artificial na forma de um lobo ou lobisomem, que dormia aos pés de sua cama (leia mais sobre, aqui).

Servidores na Magia do Caos

Imagem: Chariot’s Wheels

A partir da ideia de elementais artificiais, os círculos de Magia do Caos aperfeiçoaram as metodologias para criação de servidores que realizassem ações para o magista. Entre outras definições, a criação de servidores pode ser entendida como o ato de plasmar, no mundo externo, uma porção da psiquê do magista, na forma de uma entidade separada. Em seu trabalho User’s Guide to Servitors, o autor Phil Hine comenta que:

Ao deliberadamente germinar porções de nossa psiquê e identificá-las por meio de um nome, traço, símbolo, nós podemos trabalhar com elas (e entender como elas nos afetam) a nível consciente.

Sendo assim, a atuação dos servidores é, por um lado, similar à dos sigilos (uma vez que há intuitos e objetivos específicos embasando sua criação), e por outro lado mais independente (pois os servidores podem se movimentar pelo astral para realizar estes serviços de forma mais direta, também se comunicando de forma mais direta com o magista). De forma geral, os servidores podem ser relacionados a um sigilo, ou a um objeto, que servirão como sua morada ou simples ponto de ancoramento, e possuem algumas características essenciais — na definição típica Caoísta:

  • Criação Consciente: os servidores são criados conscientemente, de forma deliberada, por um magista, e não possuem previamente uma existência própria como um aspecto mental, natural ou espiritual.
  • Especificidade: os servidores são criados com características e objetivos específicos, incluindo limitações, traços de personalidade, fontes específicas de alimentação e formas específicas de evocação/destruição. Para especificar tais aspectos, pode ser feito um contrato por escrito.
  • Movimentação: diferente de sigilos, fetiches ou outros elementos mágicos inanimados e imóveis, geralmente se considera que os servidores podem fluir pelo astral, e podem realizar atividades em diferentes lugares, assim como seguir o magista, dependendo do objetivo para o qual foram criados.
  • Hierarquia: crê-se que os servidores estão dentro de uma grande cadeia contínua de entidades que se manifestam no astral, que em uma visão física equivalem às faixas vibracionais e às diferentes frequências. Os servidores estariam em um grau vibracional abaixo do nosso nível mental, nessa cadeia, sendo subordinados à nossa vontade e dependentes da nossa energia.
  • Desenvolvimento: existe também a ideia de que o servidor pode se desenvolver com o tempo e mudar de nível hierárquico. Por medo, culpa, ou por algum tipo de paranoia que transforme o servidor em um inimigo do magista (pedidos não cumpridos, ou extraviados, insatisfação do criador quanto à atuação do servidor), ele poderia ganhar uma energização excessiva e se alimentar do medo que ele percebe estar gerando no usuário de sua energia. Por outro lado, haveria a possibilidade do servidor ganhar reverência, ser recompensado, ser colocado acima de seus usuários como se fosse um deus, ou se tornar conhecido por muitas pessoas e por mais de uma geração humana, e então sua energização hiperbólica o transformaria em algo superior, independente.

Cabe ressaltar que servidores podem ser construídos com base em entidades já existentes, mas neste caso eles não serão aquela entidade propriamente dita, apenas compartilharão aspectos com a mesma. O mesmo se aplica a servidores criados a partir de personagens fictícios ou pessoas que existem ou existiram. O ato de um magista se conectar à energia destas entidades, personagens ou pessoas (e às suas egrégoras) seria vetorialmente diferente da criação de um servidor relacionado a elas.

Os 40 Servidores e os 4 Demônios

Os 40 servidores foram criados pelo magista e artista visual Tommie Kelly, utilizando arquétipos conhecidos pela sociedade contemporânea para obter um conjunto completo e coerente representando o universo Físico, Mental e Espiritual. Neste conjunto de servidores, cada um representa alguns aspectos, e tem seu próprio campo de atuação, sendo que podem ser utilizados para divinação, ou obtenção de objetivos diversos.

Na página do projeto, podem ser encontradas maiores informações sobre os 40 Servidores, assim como um guia de utilização em português.

Imagem: GIF dos 40 servidores, por Tommie Kelly.

Além dos 40 servidores, Kelly criou 4 demônios que englobam aspectos mais gerais, e possuem área de atuação mais completa, relacionados a Saúde, Riqueza, Felicidade e Sabedoria. De certa forma, estes 4 aspectos se relacionam com os elementos Fogo (a centelha de vida), Terra (os bens materiais), Água (os sentimentos) e Ar (o conhecimento), respectivamente.

TecnoXamanismo e Cybermorfos

No Tecnoxamanismo, um movimento recente que tem realizado oficinas em vários países e angariado entusiastas por todo o mundo, as técnicas e filosofias xamânicas são aliadas à tecnologia para criar rituais, práticas e estudos que se beneficiem de aspectos ancestrais e futurísticos. Uma das práticas é a criação de robôs mimetizando organismos vivos, que podem servir como pequenos familiares. Estes familiares podem ser utilizados, então, como moradas para servidores, sendo sua representação no plano físico.

Imagem: criação de um organismo cibernético que emite sons como um pequeno inseto e se alimenta de energia solar (Oficina BEAM — Organismos Solares).

Um conceito similar é explicado por Peter Carroll em seu livro PsyberMagick, com a denominação de “Cybermorfo”, um corpo físico que pode ser associado a um Servidor ou Eidolon:

“O magista pode criar uma base material para um Cybermorfo de propósito geral (…). O magista pode carregar fisicamente a base material próxima ao seu corpo em todos os momentos (…). O magista pode, por esforço profundo em rituais, fantasia e imaginação, tratar as formas astral e material do Eidolon como sigilos para uma senciência nomeada e semi-autônoma”.

No caso de ser criado um servidor para um propósito específico pelo magista, a ligação entre ele e o servidor seria maior do que utilizando-se uma entidade já existente. Além disso, o corpo material (sendo ele cibernético ou um objeto mais simples) também facilita a conexão entre o magista e a entidade. Dessa forma, os resultados do trabalho mágico são otimizados.

Criação de Servidores

A criação de servidores pode ser realizada por diversos métodos, incluindo adaptações de métodos milenares, ou métodos próprios. Vários fóruns de Magia do Caos descrevem métodos para a criação, incluindo modelos de contratos que permitem limitar a atuação do servidor para os objetivos específicos. Pode ser utilizado, por exemplo, um método análogo aos de sigilização (como os descritos por Carroll, detalhados aqui), inclusive atrelando o servidor a um sigilo que tenha sido criado anteriormente.

Imagem: exemplo de criação de um servidor para auxiliar a fazer sigilos, a partir de um sigilo — por Gabriel Costa.

Após a definição da forma que o servidor irá tomar, este deve ser mentalizado, preferencialmente com foco no sigilo ou no objeto físico (se houver) que irá ancorar a entidade. Outra técnica possível é imaginar o servidor andando ao lado do magista, até que esta imaginação se torne tão natural que ocorra automaticamente, sem necessidade de esforço mental — automaticamente, será entendido que o servidor está acompanhando o magista.

Alimentação Energética

A definição da fonte de energia que alimentará o servidor é importante, pois permite seu fortalecimento, e sua obtenção de recursos para realizar as atividades propostas pelo magista. Esta fonte pode ser definida no contrato (se houver), ou pode ser, de forma simples, a própria força de vontade, intenção, ou energia psíquica do magista que criou o servidor.

Alternativamente, a fonte energética pode ser a visualização do sigilo por qualquer pessoa, o agradecimento público após a realização dos objetivos, o uso de velas e incensos, oferendas em geral, ou mesmo energia elétrica, no caso de cybermorfos.

Visualização e Contato

Como mencionado anteriormente, é interessante que a primeira visualização e o primeiro contato com o servidor se deem no momento da criação, para que sua forma seja moldada e seus objetivos fiquem bem definidos. Após este momento, o servidor pode ser enviado para sua morada, ou banido temporariamente, retornando quando for solicitado. Sendo assim, a visualização e o contato se darão por meditação, imaginação ativa, viagem astral, ou outro método à escolha do magista, sempre que o servidor for convocado para um diálogo, ou para realizar nova atividade.

Destruição

Quando um servidor não for mais desejado, pode ser banido permanentemente, ou destruído. Neste caso, o método de destruição também pode ser definido a priori no contrato, mas de forma geral a destruição da morada física ou sigilo, ou ainda a reabsorção pela psiquê do magista, bastariam para sua finalização.

Lembrando que um servidor é uma porção da mente do magista plasmada no mundo externo na forma de uma entidade. Dessa forma, este será apenas tão poderoso quanto o for o próprio magista, e a força de vontade se apresenta como elemento importante para comandar sua atuação. Pela Lei da Correspondência, magista e servidor se tornam indissociáveis (mesmo que isto não seja compreendido de forma consciente) desde o momento da criação.

Imagem: os 40 servidores, por Tommie Kelly.

Por: Projeto Xaoz.

Referências: O livro dos resultados — Ray Sherwin; Liber Null e Psiconauta — Peter CarrollPsybermagick — Peter CarrollThe Goetia of Dr Rudd — Skinner e RankineA Magia das Formas-Pensamento — ASHCROFT-NOWICKI, Dolores e BRENNAN, J. H.Os Quarenta Servidores— Tommie KellyCaos Condensado — Phil Hine.

Magia do caos

Sigilos

Desde tempos imemoriais o ser humano tem expressado ideias por meio de símbolos e glifos. Dos símbolos Adinkra africanos até a notação matemática moderna, estes símbolos expressam ideias que não poderiam ser descritas em poucas palavras, por serem conceituais e arquetípicas — e por vezes se desdobrarem em mais de uma interpretação. Símbolos também foram usados para criptografar mensagens, certificando que apenas os conhecedores da estrutura de tradução teriam acesso ao conteúdo das mesmas.

Imagem: alguns símbolos Adinkra compilados por Robert Rattray.

Por volta de 1500, magistas começaram a registrar de forma escrita um sistema mágico baseado em codificar intenções na forma de desenhos compostos por símbolos e traços, servindo como método geral. Entre estes magistas, podem ser citados Agrippa e Trithemius, que em sua Steganographia apresentou o primeiro grande trabalho conhecido sobre o uso de sigilos especificamente para fins mágicos. Porém, está prática já era conhecida anteriormente, de forma indireta, nos cinco livros do Lemegeton, cujo conteúdo é atribuído ao Rei Salomão (que reinou por volta de 970 a 920 A.C.).

Mais recentemente, por volta de 1910, Austin Osman Spare retomou este conhecimento e publicou novos trabalhos sobre o assunto, e por volta de 1987 Peter Carroll fez o mesmo, aprimorando ainda mais esta arte.

Selos e Sigilos

Embora “sigilo” derive do latim “sigilum”, estando relacionado também ao hebraico “segulah”, e signifique tão somente “selo”, os significados das duas palavras são por muitas vezes diferenciados no sentido da prática mágica.

  • Selos geralmente se referem a símbolos que representam energias, entidades ou forças astrais e espirituais.
  • Sigilos geralmente se referem a mensagens ou intenções codificadas na forma de desenhos (ou mesmo outros formatos não pictóricos).

Sigilos na Antiguidade

De forma geral, os alfabetos utilizados atualmente derivam de símbolos, modificados através do tempo. Uma cabeça de búfalo, por exemplo, foi estilizada e modificada ao longo dos anos até se tornar a letra “A”. Os egípcios usavam os hieróglifos, e no Japão a escrita Kanji ainda tem em seus traços grande similaridade com os elementos que busca representar.

Quanto à construção de desenhos a partir de mensagens e frases, a escrita árabe sempre permitiu esta prática. As palavras árabes são conectadas por uma linha contínua, um fio condutor que permite sua torção e disposição em arranjos elaborados. Sendo assim, nos adornos de templos e na heráldica era comum encontrar desenhos que codificavam frases ou nomes. As suras do Alcorão, por exemplo (com exceção da 9ª), iniciam por Bismillah, que forma um “fecho” e permite que a frase seja amarrada em torno de si mesma com fácil localização de seu início e fim. Além disso, nas práticas judaicas da Merkabah, a entrada nos níveis celestes era auxiliada pelos selos correspondentes, que deveriam ser desenhados pelo magista.

Imagem: escrita artística árabe, no comic book Habibi, de Craig Thompson.

Na África subsaariana, os sigilos também eram extensamente utilizados, como por exemplo para codificar histórias, e para evocar energias ancestrais. A ideia de desenhar histórias e mensagens na areia, em tramas elaboradas, era muito utilizada pelo povo Tchokwe, da Angola (e chamada de desenho Sona). Já no campo mágico e espiritual, uma das práticas mais conhecidas de sigilização africana é o Traçado de Pemba, utilizado tanto para ancorar entidades no plano físico quanto para atrair suas qualidades ou codificar intenções e desejos.

Imagens: (a) desenho Sona contando a história de criação do mundo (site Rede Angola Cultura); (b) Pontos Riscados de entidades (site Umbanda Candomblé Comunidades); (c) Ponto Riscado com atributos de Oxalá (blog Astrologia dos Orixás).

A sigilização é presente também na cultura Nórdica, com o uso de Bandrunar (união de runas) e Insigils (sigilos rúnicos). Estas práticas da Magia rúnica consistiam na elaboração de desenhos que eram usados como talismãs ou entalhados na madeira das casas, buscando proteção ou sorte em batalhas. O desenho mais conhecido deste tipo é o Ægishjálmr, ou Elmo do Terror, um símbolo rúnico representando o elmo de mesmo nome que é citado nas Eddas, usado para a proteção de casas e pessoas.

Imagem: Ægishjálmr em um Galdrabók antigo. Fonte: Wikimedia Commons.

Nas histórias nórdicas, o elmo Ægishjálmr podia tornar seu usuário invisível, bem como fazê-lo se transformar em qualquer monstro para amedrontar seus inimigos, porém instilava cobiça e inveja em seus corações. Posteriormente, estas características foram imputadas a um anel, nas quatro Óperas de Wagner que formam a série O Anel dos Nibelungos. Estas óperas, além do mito original do Ægishjálmr, serviram como base para O Hobbit e O Senhor dos Anéis, de Tolkien.

Sigilos no Lemegeton

Nos livros Ars Theurgia e Ars Goetia, que fazem parte do Lemegeton, são descritos os selos dos líderes espirituais, dos Daemons e dos Shemhamphorash. Já no Ars Paulina, são descritos os selos planetários, muitas vezes direcionados para uma intenção específica, e no Ars Almadel são apresentados os selos dos principais coros de anjos, bem como suas conjurações.

Imagem: alguns selos planetários do Ars Paulina, utilizados para finalidades específicas, conforme apresentados na Clavícula de Salomão, de Samuel Mathers.

No Ars Notoria, são apresentados sigilos (chamados de Notas) que podem ser utilizados para as mais variadas finalidades, como acelerar o aprendizado ou obter conhecimento sobre uma área da ciência ou uma língua estrangeira. Os sigilos usados na Arte Notória eram construídos pelos magistas usando símbolos e elementos pertinentes àquela área do conhecimento. Por exemplo, o sigilo referente à gramática incluía os nomes de diferentes aspectos do discurso (morfologia, sintaxe, vocabulário, etc). Já o sigilo utilizado para aprender geometria contava com desenhos de linhas, triângulos, quadrados, pentagramas, estrelas de seis pontas e círculos.

As práticas Salomônicas, assim como as chinesas, consideravam que os portais de comunicação entre o mundo físico e o espiritual se abriam em lugares e horários específicos, por isso as direções cardeais e as horas planetárias sempre foram de vital importância na realização de qualquer intento mágico por estes sistemas.

Sigilos na Steganographia

Reconhecido como um livro de magia angelical e criptografia, este livro foi escrito por volta de 1499 pelo monge beneditino Johannes Trithemius, e utilizado por Agrippa, John Dee e Austin Spare em seus trabalhos. A ideia geral do livro era a de codificar mensagens por meio de sigilos, e então enviá-las para pessoas distantes, por meio espiritual. As mensagens poderiam também ser enviadas a espíritos angelicais, que então iriam realizar os desejos ali descritos, funcionando por si só como um método de magia simpática (sistema mágico baseado na atração do que é desejado).

Imagem: capa da Steganographia de Trithemius. Fonte: Wikimedia Commons.

Na Steganographia, são descritos métodos de sigilização que permitem a representação pictórica de desejos e intenções. As mensagens, antes escritas em Inglês, Latim, Hebraico ou Enoquiano, poderiam ser descritas de forma mais exata e desambígua desta forma sigilizada, o que facilitaria sua transmissão e realização. O trabalho mental envolvido na elaboração do sigilo faria parte, segundo Trithemius, da prática mágica, e potencializaria seu efeito. Após o desenvolvimento do sigilo, este era enviado à entidade desejada, o que deveria ser feito na hora correta e voltando-se para a direção cardeal adequada.

Sigilos por Austin Spare

Austin Osman Spare criou, por volta de 1910, técnicas de desenho e escrita automáticos, além de métodos de sigilização e um culto voltado à libertação do “verdadeiro eu” dos magistas, chamado Zos Kia. Em seu Livro do Prazer (Livro do Êxtase ou do Auto-Amor), Spare descreve como os sentimentos inconscientes podem estar ligados ao funcionamento da realidade externa, e como podem interferir na mesma, apresentando glifos para sua representação e práticas mágicas que incluem seu uso.

Imagem: correlação entre o alfabeto do desejo de Austin Spare, os símbolos de Peter Carroll e os símbolos alquímicos, apresentado em Liber Null e Psiconauta.

Nas descrições de sua prática com sigilos, Spare deixa claro que o envio de mensagens para serem atendidas por instâncias espirituais deve ocorrer de forma criptografada, uma vez que a linguagem humana não é suficiente para esta atividade. Além disso, Spare não utilizava horários, direções cardeais ou nomes de entidades, pois considerava que a realização dos intentos codificados nos sigilos ocorria por uma ou mais forças espirituais em consonância com o inconsciente do próprio magista.

Portanto, no momento da conjuração seriam selecionadas as energias corretas para levar a cabo cada objetivo, que então direcionariam o fluxo energético através do Éter. Este pensamento foi um dos que levou ao surgimento de novas vertentes de magia, baseadas em aspectos psicológicos e operadas pelo inconsciente do próprio magista. Isto aproximou ainda mais a magia da psicologia, e permitiu o uso mágico de ferramentas da psicanálise em conjunto com reinterpretações das evocações e invocações tradicionais.

Sigilos não Pictóricos

Além dos sigilos pictóricos, existem sigilos que codificam intentos de forma não pictórica, como mantras, músicas, frases, talismãs ou mesmo esculturas. A dinâmica de seu funcionamento é explicada pela Lei da Correspondência Hermética. Um objeto ou uma frase podem atrair algo desejado, bastando existir uma conexão entre o que foi feito, e o objetivo a ser atraído. Na magia egípcia, isto era realizado por meio de entalhes nas paredes, talismãs ou estátuas, e considerava-se que qualquer objeto consagrado iria formar uma versão “gêmea” de si no plano etérico, que poderia atrair ou repelir energias.

Imagem: músicas da série de jogos Zelda, que são utilizadas para teletransporte ou para manipular a realidade. Compiladas por OhRogan, no site Deviantart.

Hipersigilos

Quando os sigilos possuem uma extensão maior do que apenas a elaboração de um objeto, desenho ou frase, e necessitam de um maior tempo para sua manufatura, podem ser chamados de Hipersigilos. Entre os exemplos de hipersigilos, podem ser citados construções arquitetônicas, músicas com letras elaboradas, pinturas, livros, personagens ou pseudônimos criados especificamente para este fim.

Imagem: Cartuchos de Tuthmosis III em Deir el-Bahari. Fonte: Wikimedia Commons.

Egiptólogos atuais têm descoberto cada vez mais que os templos egípcios eram construídos com base em regras complexas de dimensionamento e posição, servindo como relógios astrológicos ou mesmo como grandes efígies que buscavam atrair energias específicas. Uma das descobertas mais fascinantes neste sentido, realizada pelo egiptólogo Schwaller de Lubicz, foi a de que a maioria dos templos egípcios possuíam marcações em todas as suas peças, e que os blocos se encaixavam em lugares específicos e únicos, formando uma rede de linhas e circuitos que perpassava por toda a construção, como se esta fosse um organismo vivo dotado de sistema circulatório (supostamente para a circulação de energias). Quando os templos eram desmontados, todas as peças tinham seus canais destruídos com um golpe de cinzel, e deixavam de ter ligação com a egrégora do Templo. Neste sentido, os Templos Egípcios podem ser considerados Hipersigilos.

Imagem: entalhes e circuitos simbólicos em templos egípcios, fotos por John West em A Serpente Cósmica.

A prática de Sigilização

A sigilização (ou sigilação) consiste na prática de construir sigilos a partir de uma mensagem ou intenção. Os métodos utilizados podem variar desde o uso de glifos e símbolos já existentes, passando pela criação de novos símbolos pelo magista, e o uso de alfabetos vulgares ou mágicos.

Peter Carrol descreve a operação de um sigilo, em seu Liber Null e Psiconauta, como sendo composta por três partes: sua construção; seu envio para o inconsciente; e seu carregamento ou ativação. As três etapas podem ser realizadas por vários métodos, desde os mais tradicionais aos contemporâneos, à escolha do magista.

Sigilização pelo método de Carroll

Carroll apresenta três exemplos de métodos para a construção de sigilos. O primeiro método é baseado nas letras do alfabeto: escreve-se uma frase, eliminam-se as letras repetidas (e/ou as vogais), e combinam-se as letras restantes na forma de um desenho.

Imagem: exemplo de sigilização alfabética, por Gabriel Costa.

O segundo método é pictórico: desenha-se a intenção desejada e simplifica-se o desenho em etapas, até a obtenção de um símbolo que não represente, à primeira vista, o que foi desenhado inicialmente.

Imagem: exemplo de sigilização pictórica, por Gabriel Costa.

O terceiro método é mântrico: a partir da frase que codifica a intenção, eliminam-se algumas letras e cria-se um mantra que não descreva, em linguagem falada atual, o objetivo inicial.

Imagem: exemplo de sigilização mântrica, por Gabriel Costa.

Outros métodos de Sigilização

Outros métodos podem ser utilizados para a construção de sigilos, como por exemplo as rodas alfabéticas, onde traçam-se linhas passando pelas letras que restaram da frase inicial, e cria-se um desenho estilizado.>

Imagens: (a) quadrado mágico árabe (por Craig Thompson, em Habibi); (b) roda das bruxas para a criação de sigilos (por Maureen Murrish, em The Wheel of the Year); (c) símbolo RosaCruz contendo as letras hebraicas (site ChaosTarot).

A combinação de símbolos é um outro método interessante para a criação de sigilos. Estes símbolos, por sua vez, podem provir de alfabetos mágicos existentes, ou podem ser criados pelo próprio magista.

Imagem: 13 sigilos elementais, por Gabriel Costa.

Sigilos na forma de circuitos, cuja prática tem se iniciado na Tecnomagia, ou ainda sigilos na forma de programas computacionais, também podem ser utilizados para obter efeitos de longo prazo ou aproveitar os benefícios do uso de computadores como facilitadores na prática de sigilação. Existem ainda diversos softwares que auxiliam na criação de sigilos, como o Sigilscribe.

Imagem: circuito de sigilos elementais, por Gabriel Costa.

Carregamento e Ativação de um Sigilo

Após elaborado, um sigilo deve ser lido pela parte consciente da psiquê, enviado para a parte inconsciente, e carregado ou ativado. Em outras palavras, deve ser “consagrado” para que, além da existência física, passe a ter existência no plano astral ou espiritual.

Carroll apresenta alguns exemplos de métodos para isto, como a ativação em estados de emoção extrema, êxtase sexual, ou, preferencialmente, em estado de Gnose. O sigilo também pode ser queimado, enterrado, ou lançado no oceano, ou ainda repetido diversas vezes até a perda do significado, no caso de mantras ou frases.

Nestes casos, o importante é que o objetivo do sigilo não seja trazido a todo o tempo para a mente consciente, para que possa atuar a nível subconsciente. A ansiedade pelos resultados pode atrapalhar sua atração, uma vez que a mente desperta irá bloquear a atuação das energias mágicas. O Censor Psíquico, parte cética da mente que não acredita que a magia funciona por não entender de forma científica os mecanismos envolvidos, também pode atrapalhar na obtenção dos resultados.

Imagens: sigilo da artista Kindra Tia Haugen.

Caso o inconsciente possa trabalhar de forma adequada, os sigilos são uma forma eficaz de atrair os resultados desejados, bem como auxiliar as mais diversas atividades e alterar estados mentais. Os mecanismos de seu funcionamento ainda não são compreendidos cientificamente (com exceção dos aspectos psicológicos e simbólicos envolvidos), e vêm sendo atribuídos a espíritos, anjos, demônios ou forças psíquicas. De qualquer forma, o conhecimento do mecanismo não é estritamente necessário, desde que os resultados sejam alcançados.

Ninguém precisa acreditar em magia.

Mas que ela funciona, funciona.

Por: RoYaL.

Referências: O livro dos resultados — Ray Sherwin; Mistérios Nórdicos — Mirella Faur; A Clavícula de Salomão — Samuel Mathers; A Serpente Cósmica — John West; Liber Null e Psiconauta — Peter Carroll; The Goetia of Dr Rudd — Skinner e Rankine; Habibi — Craig Thompson.

Pop Magick

As Referências Ocultistas em Hora de Aventura

Com algumas historinhas passageiras e sem conexão direta entre si, estilo de desenho simples e piadas aparentemente inocentes, em Hora de Aventura somos transportados para a Terra de Ooo, e acompanhamos as aventuras de Finn, o Humano, e Jake, o Cão. Com o passar das temporadas, porém, é percebido um fio condutor por trás das aventuras aparentemente desconexas, com tramas muito complexas e misturas de sentimentos que poderiam muito bem fazer parte de uma obra niilista ou de um livro de teorias metafísicas.

Imagem: Finn e Jake, por Gabriel Costa.

Porém, antes de começarmos a navegar pela história da Terra de Ooo, é preciso dar um alerta: as informações contidas neste texto seguem uma ordem temática, e abordam todos os episódios lançados até hoje. Portanto, se não quiser receber spoilers, pare de ler aqui, ou peça para um amigo filtrar as informações para você.

O Apocalipse

Imagem: Simon e Marceline após o Apocalipse.

No passado distante, havia dinossauros e outros seres (alguns deles humanoides e inteligentes) convivendo em harmonia, e os magos eram muito poderosos, manipulando os elementos e moldando a realidade. Porém, um meteoro caiu no planeta, e os últimos magos foram enterrados para sempre, assim como a vida pujante que cobria as terras. Após a queda do meteoro, a vida teve um intenso trabalho para voltar a florescer, até que surgiram novos animais, os mamíferos proliferaram sobre o Planeta, e a evolução seguiu em frente, até o surgimento dos humanos como os conhecemos hoje.

Nesta época, o planeta era como o que vivemos agora. Surgiram cidades, maravilhas tecnológicas, e o progresso tornou tudo mais organizado e até certo ponto mais civilizado. Os elementos e a magia foram enterrados (para sempre, pelo que parecia), e a interface entre o plano físico e os planos astral, elementais e espirituais se enrijeceu. Os humanos perderam completamente o contato com estes mundos.

Até que uma guerra de proporções globais eclodiu. Países batalhavam uns contra os outros, enviando bombardeios e tropas para destruir aqueles que antes da chamada Guerra dos Cogumelos eram seus irmãos ou parceiros comerciais. Neste contexto, desenvolveu-se uma bomba com altíssimo potencial mutagênico, que foi detonada, liberando o mal sobre a Terra.

Imagem: a explosão da bomba na Guerra dos Cogumelos e o surgimento do Lich.

Esta bomba foi construída por um cientista que ouvia sussurros ao seu ouvido, e sua detonação foi encomendada por uma força muito Antiga, a mesma força que havia chegado à Terra na forma do meteoro que destruiu os dinossauros, e que almejava obter controle sobre o Mundo. O Lich se levantou do local onde a bomba havia explodido, e começou a angariar seus exércitos de mutantes. Com a explosão da bomba, as barreiras entre os planos foram enfraquecidas, e seres e energias começaram a passar de um plano para outro. A magia, então, voltou à Terra, assim como os magos e outros seres. Os humanos, muito frágeis neste novo mundo, foram sendo extintos aos poucos, e os últimos deles migraram para terras distantes. O grande continente central passou a ser chamado de Terra de Ooo, e o último humano restante neste continente era Finn.

Cometas Catalisadores

Ao longo da história do Universo de Hora de Aventura, a cada 1.000 anos, chega à Terra um cometa catalisador, trazendo agentes de mudança que irão moldar os acontecimentos de forma drástica.

Imagem: cometas catalisadores.

São citados quatro meteoros principais:

  • O meteoro laranja, onde chega o Orgalorg, uma entidade cósmica que deseja absorver o poder de um cometa catalisador e posteriormente se disfarça como o pinguim Gunther;
  • O meteoro verde, trazendo o Lich, responsável pela destruição dos dinossauros e posterior retorno da magia ao mundo, que deseja mesclar as realidades do multiverso;
  • O meteoro azul, trazendo ao planeta uma energia benéfica que reencarna de várias formas, dentre elas uma borboleta, uma guerreira, e Finn, o humano;
  • O meteoro violeta, contendo uma entidade de muita sabedoria que mostra para Finn que há escolhas, e que ele pode escolher não impedir o fim do mundo — as pessoas que ele ama morreriam, mas o universo encontraria um novo equilíbrio, e não necessariamente isso seria pior.

Esta questão da data-limite e de horizontes de tempo onde ocorrem eventos disruptivos é abordada em diversas vertentes filosóficas, tendo inclusive semelhança com o cronograma de eventos de extinção em massa que é amplamente aceito pela ciência e que ocorreu na história de nosso planeta. Em Hora de Aventura, tais eventos criam linhas do tempo próprias, e são sempre incitados direta ou indiretamente pelos seres que chegaram em cometas catalisadores.

Os Universos e os Planos

Vários universos e planos coexistem na Terra de Ooo, e alguns ocupam o mesmo espaço, em faixas de vibração diferentes. Um desses planos é o plano astral ou etérico, que pode ser visto com “olhos de mago”. Em alguns casos, também, Finn e Jake fazem viagens extra-corpóreas para este plano, sendo ajudados pelo Rei Gelado, que consegue vê-los. No plano astral habitam diversos elementais, demônios e outras criaturas, que não têm efeito tão direto sobre os humanos em geral, mas afetam psicologicamente os magos que podem vê-los.

Imagem: o plano astral, como visto pelo Rei Gelado.

De forma geral, o Cosmos abordado no desenho usa um conceito de Multiverso, incluindo alguns universos com características diferentes, mas também alguns com as mesmas características do que contém a Terra de Ooo, e linhas do tempo diferentes. Em diversos momentos, as realidades se mesclam, ou se separam, dependendo de acontecimentos importantes na linha do tempo principal do desenho.

Imagem: os diferentes Universos que Lich deseja mesclar.

Neste sentido, o plano do vilão Lich é destruir as barreiras entre as realidades, para que os Deuses Antigos tenham acesso a todas elas, e possam assim se alimentar de almas e destruir os Mundos. Finn, enquanto encarnação de um cometa catalisador com missão de combater o mal, se esforça ao máximo para impedir que o Lich consiga esta proeza.

Alguns dos acontecimentos mais importantes são previstos em sonhos por meio de profecias. Porém, os habitantes de Ooo sabem que um sonho somente é profético se houver nele a presença da Coruja Cósmica. Mesmo quando ela surge, muitas vezes os acontecimentos previstos ocorrem de forma totalmente diferente do esperado, ou então uma sequência inesperada de eventos leva os sonhos a se realizarem.

Imagem: a Coruja Cósmica em seu apartamento.

Este conceito de uma certa classe de sonhos proféticos ou arquetípicos é discutida por Jung em algumas de suas obras, e era considerado por diversas culturas primitivas, sendo geralmente sonhados e comunicados ao povo por um líder espiritual ou Xamã.

Os 4 Elementos

Ao longo de toda a história da Terra de Ooo, há seres que possuem os aspectos mais primordiais dos 4 elementos: Doce, Gelo, Fogo e Gosma. Estes elementais tentam por milênios se manter à paisana, acompanhando os acontecimentos sem interferir diretamente. Porém, na minissérie Elemental, a atual elemental do Gelo, Paciência St. Pim, acorda depois de sua hibernação com o desejo de despertar o poder máximo dos elementos. Sendo assim, traz à tona o poder elemental da Princesa Jujuba, da Princesa de Fogo e da Princesa Gosminha, que conjuram seus reinos na superfície de Ooo, dividindo-o em quatro regiões.

Imagem: os 4 reinos elementais manifestados na Terra de Ooo.

Os quatro elementos, que chegam a seu epíteto na minissérie Elemental, são apresentados repetidamente durante todas as temporadas. Também correspondem a sentimentos específicos, e os Seres Elementais possuem estes sentimentos mais aflorados. Assim:

  • Fogo: está relacionado à Raiva, e seus cidadãos têm constantes acessos;
  • Doce: tem como foco o sentimento de Alegria, sempre fazendo festas;
  • Gelo: seus cidadãos possuem aspecto de Tristeza e melancolia;
  • Gosma: tem relação com Inveja, e seus cidadãos tendem a ser pedantes.

Baixa Magia

Após a explosão da grande bomba na Guerra dos Cogumelos, a magia voltou a fluir para a Terra de Ooo. Nasceram magos que utilizam os mais diversos tipos de elementos e poderes, e estes vivem em sua maioria na Cidadela dos Magos, realizando também torneios periódicos para testar seus poderes.

Imagem: batalha de magos.

Esta classe de magos utiliza a magia de forma intuitiva, no estilo do que seria a Baixa Magia, como poderes que fluem de suas varinhas ou de suas mãos, e são considerados raças diversas da humana. Alguns se organizam em covens, com vertentes e métodos específicos de preferência.

Alta Magia

Imagem: o Mordomo Menta realizando Magia Cerimonial.

Porém, há outros cidadãos da Terra de Ooo que não nasceram magos, e aprenderam a usar a magia por meio de rituais e cerimônias, algo próximo do que seriam as vertentes de Alta Magia. Este é o caso, por exemplo, do Mordomo Menta, que, utilizando magia cerimonial em um paradigma muito próximo ao Salomônico, conseguiu se tornar amigo da Morte, também ajudando Finn e Jake em assuntos de ocultismo em diversos episódios.

Imagem: demônios atravessando o círculo de sal de Jermaine.

Jermaine, irmão de Jake, herdou instrumentos mágicos e conhecimentos de ocultismo de seu pai, Joshua, e sua mãe, Margaret. Os pais dos dois cachorros tinham uma empresa de investigação de fenômenos paranormais, e por isso sua casa é repleta de itens curiosos, como por exemplo um tapete com ilustração da árvore da Cabala e uma espada feita de sangue de demônio. Devido a possíveis retaliações pelas lutas de seus pais contra diversas entidades, Jermaine precisou fazer um círculo de sal em torno de sua casa, que é destruído por Jake quando este precisa temperar sua comida.

Imagem: filha de Jake tirando as cartas para entender seu inconsciente.

Neste sentido, observa-se que na Terra de Ooo há uma convivência entre dois tipos de magia: uma delas mais instintiva, e outra mais cerimonial. Há também referências específicas a muitas vertentes mágicas Orientais e Ocidentais ao longo dos episódios, assim como rituais específicos.

TecnoMagia

Imagem: princesa Jujuba criando sua família doce.

Outras personagens da Terra de Ooo possuem menos afinidade com magia e mais afinidade com tecnologias, o que é o caso da Princesa Jujuba e de Betty Grof, ex-namorada de Simon (que posteriormente se tornou o Rei Gelado). Mesmo nesse caso, as tecnologias apresentadas são tão evoluídas que é feito um paralelo com a magia, entendendo-se que tecnologias suficientemente avançadas são indissociáveis de magia para quem não as compreende.

Imagem: Betty Grof perdendo a linha após transfusão mágica em um aparelho de destilação.

Neste sentido, observa-se uma aplicação do conceito da Tecnomagia enquanto uma forma de magia que busca mesclar elementos tecnológicos às teorias e aos paradigmas mágico-espirituais, no sentido de não haver hierarquia entre ambos e permitir-se seu uso conjunto e harmônico.

Os vampiros

Marceline é a vampira mais famosa de Hora de Aventura. Porém, ao decorrer das temporadas, é explicado que ela era apenas um meio-demônio, filha de uma humana com o demônio Hunson Abadeer. Explica-se então que o poder original de Marceline é absorver almas (poder do qual ela abre mão quando passa a sugar apenas a cor vermelha das coisas), e que às vezes este poder faz com que absorva poderes extras.

Marceline, abandonada pelo pai demônio, fica perdida nos destroços do mundo pós-apocalíptico, e é encontrada por Simon, que enlouquece após utilizar por muito tempo a coroa do Gelo e precisa partir. Em suas jornadas solitárias pelo mundo destruído, Marceline encontra um acampamento de humanos, e descobre que eles são constantemente atacados por vampiros, correndo risco de extinção. Sendo assim, decide ir atrás dos vampiros, matando-os e absorvendo seus poderes: voo, regeneração, metamorfose, controle mental e telecinese.

Imagem: os 5 vampiros originais.

Os nomes dos 5 vampiros originais são os de cinco cartas de Tarô, e suas personalidades também são análogas aos significados das cartas:

  • O Louco: é apresentado como totalmente aleatório, indiferente e desprendido, e tem o poder de voar;
  • A Lua: faz jogos de terror mental com as vítimas, e desperta somente à noite, possuindo poder de regeneração;
  • O Hierofante: é extremamente conservador, seguindo todas as regras de etiqueta atribuídas aos vampiros, e possui poder de metamorfose;
  • A Imperatriz: extremamente orgulhosa, busca um súdito que a sirva, e para isso usa o controle mental;
  • O Imperador: comanda os outros vampiros, e também comanda objetos e pessoas com seus poderes de telecinese.

Na minissérie Stakes, Marceline enfrenta novamente estes cinco vampiros, que voltam à vida após a Princesa Jujuba retirar todo seu fluido vampírico, curando-a do vampirismo. Porém, ao matá-los, Marceline absorve novamente seus poderes e volta a ser uma vampira, mostrando assim que o Universo tende sempre a encontrar um equilíbrio baseado na Lei do Retorno e em balanceamentos quando busca-se mudar a realidade.

Reencarnações

Além de todos os aspectos levantados, um assunto que permeia em Hora de Aventura é a questão da reencarnação. Diversas energias reencarnam na forma de minerais, vegetais, animais e humanos ao longo da História, e tendem a seguir caminhos que refletem ou compensam suas encarnações anteriores. Porém, às vezes, conseguem mudar seu destino, e suplantar tais tendências.

Este é o caso do Lich, que veio à Terra na forma de um meteoro, mas depois é curado e se torna um bebê (mas que ainda tem pesadelos de Lich). Já Finn tem uma tendência recorrente a perder um dos braços, e esta tendência permeia muitos dos episódios das últimas temporadas. Além disso, uma de suas encarnações foi um meteoro, e outra foi uma borboleta. De forma geral, observa-se que Hora de Aventura lida muito com a questão do livre-arbítrio, e mesmo no caso de um Ser possuir uma tendência específica, suas escolhas definirão se suas atitudes serão nocivas ou benéficas para aqueles à sua volta.

O Caos

No episódio final, somos apresentados ao Caos, na forma da poderosa divindade Golb, que vem ao mundo evocada por Betty usando o poder da bruxa Maja. É mencionado que seria muito poderoso, e geraria consequências catastróficas, caso alguém trouxesse todo o poder do Caos para o mundo físico. Porém, o Caos é derrotado com Harmonia (no caso específico, usando a música), e somente pela existência da Ordem tudo não se dissolve em Desordem.

Imagem: Golb, a personificação do Caos.

Sendo assim, da próxima vez que te disserem que Hora de Aventura é um desenho para crianças, explique que a pessoa não interpretou corretamente os episódios.

Por trás das entrelinhas e dos personagens coloridos, há aspectos filosóficos e ocultistas muito profundos, e a Terra de Ooo é apenas o palco para uma representação lúdica de conceitos científicos e espirituais complexos.

Por: RoYaL.

Pop Magick

Fullmetal Alchemist e a Alquimia Transcedental

Imagem: Ed e Al no Anime Full Metal Alchemist.

Edward e Alphonse Elric são os olhos pelos quais somos levados por um universo steampunk semi-mitológico, que usa cenários e contextos após a recente revolução industrial europeia, referências à cultura e ordenamento alemãos, além de vários aspectos que fizeram parte do Zeitgeist (espírito da época) medieval e vitoriano. A Alquimia. A maior parte da história se passa em Amestris, um país governado por militares capazes de transmutar e dominar parcialmente a matéria a nível atômico, com encantamentos e círculos de transmutação. A história é centrada nos irmãos Elric, que resolvem usar um complexo ritual para trazer de volta sua mãe falecida, o que acaba colocando Ed de frente com a verdade absoluta e fazendo-os pagar um alto preço.

A série japonesa de Hiroku Arakawa, que já foi considerado duas vezes pela pesquisa do site oficial da TV Asahi (uma das mais famosas do Japão) o anime mais popular de todos os tempos, hoje é um dos animes mais queridos dos brasileiros. Foi transmitido primeiramente no Animax e na RedeTV, e agora é transmitido em suas duas versões pela Netflix, com ótimas dublagens e alçando a posição de um dos animes mais maratonados no país.

Imagem: Cena do live-action Full Metal Alchemist, da Netflix.

Alquimia

AAlquimia é uma tradição baseada em elementos e processos químicos e físicos, em correlação com elementos processos psíquicos, mentais e espirituais, para alcançar a transcendência. Inicialmente Tebana e Mesopotâmica, e posteriormente aprimorada na Grécia e na Europa, usa elementos destas várias linguagens como metáforas intercambiáveis, explicando a mente pelos fenômenos do mundo físico, e vice-versa. Desta forma, este Sistema tem forte relação com o princípio Hermético da Correspondência — o que está em cima é como o que está embaixo.

Os principais elementos do sistema alquímico apresentados em Full Metal Alchemist são os processos pelos quais passa a matéria, além dos estágios pelos quais ela passa em suas diversas transformações. Os elementos básicos que formam a matéria também são citados, além de entidades físicas e espirituais que são geralmente citadas neste Sistema. Na história, existe uma tradição clássica de alquimia difundida em todo o mundo chamada alcahestria, e outra proveniente dos estudos desenvolvidos em Amestris. Há ainda as tradições de ordens que misturam vários círculos mágicos para realizar as transmutações.

Para que os círculos funcionem, eles utilizam também o que chamam de runas, símbolos que funcionam como canalizadores ou catalisadores dos elementos a serem transmutados. Pela tradição da alcahestria, os processos alquímicos são: Compreensão (entender o mecanismo dos elementos químicos) — Decomposição (separar os átomos, o processo chamado Solve na alquimia clássica europeia) — Reestruturação (reconectar os átomos na nova composição elementar, o processo chamado Coagula). Por fim, para que todos os processos se completem, é necessária a Lei da Troca Equivalente, que assegura que o processo tenha o sucesso pleno e requerido pelo alquimista, e requer para isso todos os ingredientes necessários, por vezes tomando posse de ingredientes adicionais para completar o balanço.

Imagem: Símbolos Alquímicos, autor desconhecido.

O restante deste texto irá comentar sobre aspectos específicos da série Full Metal Alchemist. Se você não assistiu a todos os episódios, e não deseja receber SPOILERS, não continue a leitura. Caso contrário, pode continuar lendo, e complemente com suas percepções nos comentários!

A Lei da Conservação

“A alquimia é uma ciência de compreensão, decomposição e recomposição da matéria. Contudo, não é uma técnica onipotente, pois não é possível criar algo do nada. Se você deseja obter alguma coisa, é preciso pagar um preço, e este é o fundamento da alquimia, a chamada troca equivalente. Existe um tabu na alquimia que não pode ser quebrado por ninguém, a chamada transmutação humana.” — Abertura da série.

O Princípio Alquímico da Conservação da Matéria, postulado por Lavoisier, diz que “Em uma reação química feita em recipiente fechado, a soma das massas dos reagentes é igual à soma das massas dos produtos”. Isso é verdade para reações onde não há transferência de matéria para o ambiente, e onde não há conversão de energia em matéria (ou vice versa), o que só ocorreria em reações de fissão ou fusão nuclear.

Imagem: montagem com cenas do mangá de Full Metal Alchemist.

Este princípio é muito importante na química como ciência, pois indica que para a sintetização de substâncias é necessária a inclusão, na forma de reagentes, de todos os átomos que farão parte do produto final.Já no sentido mental, indica que os conteúdos mentais se transformam, mas a informação não surge de nenhum lugar, apenas é moldada e toma forma. Sendo assim, é necessário, antes de qualquer trabalho intelectual ou espiritual, que o autor reconheça em sua mente os ingredientes necessários ao trabalho. Só então os metais e conteúdos psíquicos menos nobres poderão ser convertidos em outros, de maior valor.

Solve et Coagula

Em Full Metal Alchemist, os processos alquímicos são realizados mediante três etapas: a compreensão, decomposição e reestruturação. Na Arte Alquímica, as reações são pensadas também em etapas. Primeiramente, na etapa Solve, os elementos se dissolvem. Posteriormente, se reorganizam, e se cristalizam formando os produtos, na etapa Coagula. Da mesma forma, para misturas metálicas, há uma bateria de procedimentos para dissolver e separar os metais, a purificação de cada um deles, e uma etapa de coagulação, onde são formuladas novas ligas metálicas.

Imagem: Ed, Al e os alquimistas federais, no Anime Full Metal Alchemist.

Quanto a conteúdos mentais, a etapa Solve corresponde a separar todos os aspectos de uma questão que precisa ser resolvida. Em seguida, cada aspecto é analisado e purificado em separado, e o conjunto é Coagulado em um novo Todo coerente. A Psiquê é, então, reconstruída e cada um de seus elementos (incluindo a Sombra) é integrado aos outros.

Círculos de Magia

Em Fullmetal, a forma mais eficiente de realizar as manipulações alquímicas é o uso de círculos de transmutação. Esses círculos têm a função tanto de encerrar o espaço de atuação da técnica, quanto manifestá-lo no mundo real.

Em japonês, os Renseijin ( 錬成陣, círculos de transmutação) são círculos para simularem o ciclo completo da transmutação da matéria (compreensão, decomposição e reestruturação, respeitando a troca equivalente), formados de circunferências e runas. Os círculos podem ser manifestos de quaisquer formas desenhadas, sejam no corpo, em artefatos, roupas, com sangue ou mesmo como sulcos na terra. Enquanto os círculos são como condutores, simulando o leito em que corre o rio, a perfeição auto-sustentável dos planetas, os circuitos elétricos e neuronais, as runas são suas substâncias, seus fluidos, suas eletricidades, são os signos que representam os elementos contidos na operação alquímica, e podem variar muito, por serem fruto de muito estudo e teste das tecnologias.

Imagem: Cena do anime Fullmetal Alchemist — Brotherhood.

Os Círculos de Magia também são utilizados extensamente na Magia Árabe, e posteriormente por diversos outros Sistemas. Um dos tratados mais famosos de utilização de Círculos de Magia é o Lemegeton, e esta técnica é utilizada em todas as 5 vertentes da Magia Salomônica apresentadas nesta compilação.

De forma geral, os Círculos de Magia são Sigilos: selos que encerram em si intenções ou evocam energias, sendo elas planetárias, elementais ou relacionadas a entidades já existentes.

No plano mental, os Círculos de Magia ou Mandalas são usadas para representar a totalidade da psiquê, ou ainda trazer o foco para aspectos específicos da personalidade. Os Círculos devem ser compostos usando símbolos que possuem relação com a intenção visada, e que podem vir de várias linguagens: Runas, Pontos Riscados de Pemba, Tarot, Astrologia, Alfabeto Tebano, entre várias outras. A Transmutação, neste caso, refere-se à conversão de um sentimento em outro auxiliada pelos círculos e pelas mandalas, o que pode ser útil na transcendência do magista.

Imagem: alfabeto Tebano e outros alfabetos no livro The Magus, de Barrett.

Homúnculos

Na Alquimia de Fullmetal existe um tabu que é a transmutação humana. Mesmo não havendo registros de seu sucesso, é considerado algo proibido, mas, baseado no conceito milenar dessa operação no ocultismo clássico, existem algumas “exceções”. Os Homúnculos na série são criaturas humanoides com consciência geradas por meio da alquimia e do uso da pedra filosofal, e existem sete, relacionados com os pecados capitais. Ao mesmo tempo, são encarnações desses arquétipos e emanações das próprias características de seu criador, o antagonista principal da série chamado de Pai, o homúnculo primordial.

Imagem: homúnculos de Fullmetal Alchemist – Brotherhood, por sack-rabbit.

No sistema Alquímico, um Homúnculo é uma intenção personificada na forma de uma entidade, se assemelhando bastante aos Servidores utilizados em Magia do Caos. Esta entidade vive geralmente no plano astral, e surge mediante forte intenção do adepto, ou mesmo no caso de uma fecundação que não ocorreu no plano físico. A intenção do magista nasceria em outro plano, na forma de um homúnculo, assim como os 7 Pecados capitais nascem em Full Metal Alchemist. No último episódio do desenho, é entendido porque os homúnculos vivem no mesmo plano que os irmãos Elric — se trata do plano Astral propriamente dito.

Imagem: Homúnculo primordial, trecho do mangá Fullmetal Alchemist.

O conceito do homúnculo parece ter sido usado pela primeira vez pelo alquimista Paracelso, no Século XIV, para nomear uma criatura que tinha cerca de 12 polegadas de altura e que, segundo ele, poderia ser criada por meio de sêmen humano posto em um recipiente hermeticamente fechado e aquecida em esterco de cavalo durante 40 dias. Então, segundo ele, se formaria o embrião.

Porém, paralelamente a isso, era comum em diversas Ordens mágicas o carregamento de sigilos por magistas homens utilizando sêmen, o que não levaria a uma fecundação física, porém a uma fecundação astral. Para isto, podiam ser usados instrumentos específicos, como um canal estreito feito de pedra para encaixe do pênis e do sigilo a ser energizado na outra ponta.

Imagem: Homunculus – The Alchemical Creation of Little People with Great Powers.

No Século XVII, com o surgimento dos microscópios, e a observação de germes e de espermatozoides de animais e de humanos, os conceitos de Animúnculo e Homúnculo passaram a ser usados para descrever pequenos animais presentes na água de um lago, ou animais e humanos minúsculos contidos nos espermatozoides, que viriam a se desenvolver em animais e humanos dentro do útero, após a fecundação. Ainda não se tinha conhecimento sobre a existência do óvulo, o que dava ao Macho o monopólio sobre o poder criativo de uma nova vida.

Imagem: espermatozoide contendo homúnculo, no “Essay de Dioptrique” de Hartsoeker.

Golem

Após o ritual de transmutação que dá errado, Alphonse perde totalmente seu corpo, mas seu irmão consegue gerar um sigilo ancorando sua alma a um corpo artificial, que se torna sua casca enquanto busca uma forma de retornar à sua forma original. Quando ele é obrigado a viver nessa condição quase robótica, sem sentir dor, nem fome, nem sono, nem tendo nenhuma função biológica como a dos humanos, ele se transforma também numa nova criatura, uma consciência vagando num veículo rústico como aquela armadura. Al se torna um Golem.

Imagem: o Golem, armadura ligada à alma de Alphonse, no Anime Full Metal Alchemist.

Na Bíblia, no Salmo 139:16, a palavra Golem é utilizada para se referir a um corpo sem alma, o homem “cru” que ainda não teria sido terminado, aos olhos de Deus. Esta definição de um corpo sem vida já era usado desde muito anteriormente, no Talmude judaico. Além disso, no livro Sodei Razayya, escrito no Século XII, são descritos os procedimentos para a criação de um Golem.

De forma geral, um Golem seria um corpo físico criado de forma artificial por um magista, e posteriormente associado ou não a uma alma. Também pode se referir, metaforicamente, ao homem que se deixa levar pelos seus instintos, e se encontra dissociado de sua alma e de seu intelecto, agindo de forma automática e impensada, não buscando a transcendência e seu propósito divino.

Quimeras

Quimeras são geradas o tempo todo em Fullmetal mesmo utilizando a lei da troca equivalente, mas os resultados geralmente são seres disformes, reunindo características não bem ordenadas de cada animal da mistura, e na maioria das vezes são criados com objetos ruins, para serem monstros ou experimentos militares.

As Quimeras geralmente representam os instintos, ou os sentimentos não diferenciados da psiquê, que se apresentam em estados animalescos exatamente por não serem compreendidos pela pessoa que os sente. Desta forma, se apresentam de forma exagerada, ou extremamente reprimida, com aparência animalesca ou disforme.

Imagem: Edward lutando contra uma quimera, no Anime Full Metal Alchemist.

Quando os magistas tentam criar vida em Full Metal Alchemist, é o que geralmente acontece. E geralmente é o que acontece a nível mental quando há uma tentativa de manipular sentimentos de forma equivocada e sem a devida prática ou direcionamento.

A Porta

“Eu sou o que você chama de Mundo, ou então Universo, ou então Deus, ou então a Verdade, ou então Tudo, ou então Um. Eu também sou Você” — A entidade na Porta.

Imagem: cena do anime Fullmetal Alchemist, transmissão da TBS.

A ideia de um universo dividido em planos é descrita em várias vertentes filosóficas e ocultistas, como por exemplo o Platonismo, o Gnosticismo e o próprio Caoísmo. Geralmente, são descritos pelo menos dois planos, um correspondente ao mundo físico e outro ao mundo astral. Entre estes dois mundos, que convivem no mesmo espaço-tempo, porém em frequências diferentes, haveria um véu, porta ou portal, e os magistas com maior treino poderiam ver através dessa abertura, ou mesmo atravessá-la.

Em Fullmetal, existe uma porta análoga, fisicamente visitável, que simboliza o limiar entre a limitada compreensão humana, e o infinito do conhecimento universal, a consciência plena. Na série, algumas das pessoas que tentam realizar a transmutação humana são lançadas nessa Porta, de onde não saem sem pagar um preço alto. Porém, se estiverem dispostas a pagar o preço, essas pessoas adquirem compreensão plena (que é uma das etapas alquímicas da série) e perdem a necessidade de usarem um círculo de transmutação para o restante do processo. Dentro desta porta, existe uma entidade que pode ser compreendida como o Sagrado Anjo Guardião, mônada, essência, Deus ou Eu Superior de cada um que ali entra, sendo que as experiências variam e sua forma é neutra, podendo adotar uma interpretação diferente para cada consciência que se comunica com Ele.

Imagem: Ilustração da Porta Alquímica por Henry Carrington Bolton em “The Porta Magica, Rome” (The Journal of the American Folklore Society 1894) (Domínio Público).

A porta também tem uma analogia poderosa com a tradição esotérica, ao demonstrar os desenhos da árvores cabalísticas Sephirótica e Qliphótica, sendo o portal que protege a consciência dos reinos de grande expansão e evolução, e abismo e involução, estados que experimentamos em vida com nossas mentes, e nos mundos sutis com nossos corpos astrais e espirituais.

Ao fim da série são deixadas duas mensagens principais. Uma sobre o mau uso da alquimia para realização de desejos vaidosos, que mesmo trazendo conquistas e controle sobre a realidade, trazem também arrogância e prepotência. A entidade deixa bem claro: “Eu trago desespero para os prepotentes”.

Esse desespero é o próprio Abismo, o contato com a grandeza do universo que nos faz ver realmente o lugar que ocupamos, e é necessário agir sempre com sensatez e humildade, independente de seus ganhos.

A segunda mensagem é sobre o verdadeiro preço a se pagar por uma vida. A troca equivalente final, o retorno do Portão pelo corpo de seu irmão, simboliza a dissolução, a abertura de mão dos conceitos racionais e intensos controles aos quais nos colocamos o tempo todo, por uma atitude de agir conforme à naturalidade, se mesclar com o fluxo das coisas, estar realmente conectado, para se viver uma vida plena.Ed abre mão de seus poderes alquímicos para ser a alquimia perfeita, o ser humano mais nobre, evoluído e alinhado com sua verdadeira vontade possível. Recupera a vida que sempre desejou e cessa a dor de sempre lutar contra aquilo que não pode mudar.

Imagem: os irmãos tentam ressuscitar sua mãe, no anime Full Metal Alchemist.

Pode-se dizer que Fullmetal é uma obra alinhada ao Caoísmo, por trazer elementos da Alquimia clássica e redimensioná-la numa noção fantástica onde a intenção de manipulação é expressa em sua forma mais hiperbólica, mostrando as consequências do uso mal intencionado ou irresponsável do poder que a magia dá. Influenciou a cultura pop contemporânea em vários níveis, sendo inclusive um dos artifícios usados por Bruno Borges no evento do Acre, e sendo uma das maiores referências de uma mensagem modificadora na mente de milhares de fãs ao redor do mundo. Hoje pode muito bem ser usado como referência para a criação de sistemas mágicos próprios e variados usos de círculos mágicos e sigilos, sendo fonte de uma egrégora poderosa de cultuadores da série pelo mundo, além de uma base para alquimia transcendental que reside na História de incontáveis homens como o sonho de transmutar chumbo em ouro. Do sonho de transmutar o homem inferior em um ser humano de excelência.

Imagem: My Little Pony and Fullmetal Alchemist Crossover, por Prototype-No-07.

Ass.: Zero & RoYaL.

Referências: Carl Jung — Os Fundamentos da Psicologia Analítica; Carl Jung — O Homem e Seus Símbolos; Peter Carroll — Liber Null e Psiconauta; Skinner e Rankine — Dr Rudd’s Goetia; Kenneth Grant — O Renascer da Magia.

Pop Magick

H.P. Lovecraft e as entidades cósmicas

oward Phillips Lovecraft viveu de 1890 a 1937, e foi o precursor do gênero literário de terror cósmico, sendo referenciado até os dias atuais em diversas outras obras e apontado como o mais influente escritor nesta área.

Há indícios de que os personagens e entidades citados em seus livros, assim como os elementos locacionais e relíquias importantes descritos em suas obras, seriam adaptados de elementos reais com os quais Lovecraft teria entrado em contato em suas participações nos círculos da Golden Dawn. Segundo Kenneth Grant, Crowley teria, em seus diários, descrito Lovecraft como um participante dos cultos que era covarde a ponto de não suportar o vislumbre do abismo, e como alguém que não conseguiu atravessar o véu e aceitar o outro lado. Após entrar em contato com algumas entidades poderosas do Cosmos, Lovecraft teria recuado, com medo, desistindo de participar dos cultos e transformando-as em personagens das suas obras.

Imagem: H.P. Lovecraft, autor desconhecido.

Vários elementos Lovecraftianos são utilizados em práticas de magia, principalmente da Magia do Caos ou Pop Magick, devido ao seu sucesso em explicar e personificar aspectos com os quais se entra em contato nestes sistemas. Estes aspectos são, primordialmente, relacionados aos caminhos “de mão esquerda” ou “escuros”, onde obtém-se grande quantidade de conhecimentos profundos e valiosos, porém cujo alto fluxo de energia corre o risco de levar seus praticantes à loucura, caso não haja a preparação necessária.

Necronomicon

Um dos principais elementos citados nas obras de Lovecraft é o Necronomicon, um livro que teria sido escrito por Abdul Alhazred, um poeta árabe que teria ficado louco ao entrar em contato com essas divindades. Em árabe, o nome do livro é Al Azif, que por sua vez seria o nome dado ao barulho que os insetos fazem durante a noite, em alusão aos sussurros emitidos pelas entidades cósmicas aos humanos em sonhos. Ao longo de suas obras, os personagens de Lovecraft fazem associações entre as situações vividas e elementos que teriam lido no Necronomicon, o que faz deste livro fictício um elemento de coesão no universo Lovecraftiano.

O restante deste texto irá comentar sobre aspectos específicos das obras de H.P. Lovecraft e de obras literárias e audiovisuais relacionadas. Se você não leu os livros, não viu os filmes, e não deseja receber SPOILERS, não continue a leitura. Caso contrário, pode continuar lendo, e complemente com suas percepções nos comentários!

À procura de Kadath

Em sua obra À procura de Kadath, Lovecraft descreve uma viagem pelo plano astral. Em um sonho lúcido, o personagem vê o planeta Terra por trás dos véus do plano físico, e também vai até a Lua, passando por lugares que teriam sido descritos no Necronomicon. O objetivo do personagem principal, em sua jornada, é chegar à cidade dourada de Kadath, que pode corresponder à Israel Celeste, Shambala ou Eldorado, lugares de perfeição descritos em diversas correntes mágicas.

O principal inimigo nesta viagem é Nyarlathotep, o Caos Rastejante, uma entidade que aguarda na escuridão e ameaça não permitir que o viajante Astral retorne em segurança. Em uma célebre frase, o Caos Rastejante pergunta ao protagonista: “Eu faço parte do seu sonho, ou você faz parte do meu?”, analogamente ao primeiro princípio Hermético: “O Todo é Mente”.

Imagem: retorno da Lua, por Gabriel Costa.

Nas Montanhas da Loucura

Em Nas Montanhas da Loucura, uma expedição científica vai até a Antártica e descobre coisas importantes sobre o surgimento da vida na Terra, que desafiam os conceitos científicos vigentes. Os primeiros habitantes da Terra teriam sido uma raça de alienígenas com formas semelhantes a anêmonas e dotados de asas, chamados de Antigos.

Os Antigos construíram seu império onde hoje é a Antártica, e para isto criaram seres-vivos chamados Shoggoth, que possuíam capacidade de se metamorfosear em várias formas e auxiliar nas obras. Paralelamente, os Antigos teriam criado formas unicelulares de vida, que evoluíram até os animais que temos hoje. Os Antigos teriam, então, sucumbido à sua própria criação, os Shoggoth, que saíram de controle, após terem sido enfraquecidos devido a combates contra outra raça, composta por gigantes alados com faces similares a polvos.

Imagem: Shoggoth, por Gabriel Costa.

O Chamado de Cthulhu

Os Antigos, iniciadores da vida na Terra, travavam batalhas cósmicas com uma raça de gigantes alados com características répteis e de polvos. Esta raça possuía capacidades telepáticas e se comunicava com outros seres por meio de sonhos, além de produzir sons guturais que não são reprodutíveis com o aparato humano de fala. A transcrição mais próxima de um representante desta raça, em língua humana, seria “Cthulhu”.

A base utilizada por Cthulhu e sua raça durante a guerra contra os Antigos seria R’lyeh, uma ilha no Oceano Pacífico onde foi construído um império baseado em arquitetura não euclidiana e tortuosos pináculos. Após a guerra na Terra, e a derrota iminente pelos Antigos, Cthulhu foi aprisionado e a ilha foi submersa. A entidade continuou adormecida aguardando as estrelas se alinharem para retornar à superfície, e nesse meio tempo emanou mensagens enigmáticas para humanos na forma de sonhos, buscando angariar seguidores, que formaram um culto a Cthulhu.

No Chamado de Cthulhu, o protagonista entra em contato com um destes cultos, e viaja até a ilha, guiado pelos seus sonhos, assistindo ao evento do despertar do monstro. A entidade Cthulhu pode ser associada aos poderes ctônicos e aos dragões, aos instintos e ao cérebro reptiliano que, embora adormecido, deve ser compreendido e controlado na busca do magista por transcendência.

Imagem: estátua de Cthulhu, por Gabriel Costa.

A Cor que Caiu do Espaço

Em A Cor que Caiu do Espaço, Lovecraft descreve a chegada à Terra de uma entidade extraterrestre, na forma de um meteoro que cai em um poço de água e se desenvolve sob uma cidade inteira, desintegrando-a e vampirizando sua energia. Como no caso de Cthulhu, as pessoas têm sonhos estranhos, e, enquanto a energia extraterrestre se alastra pelo subsolo, as árvores e mesmo as pessoas perdem gradativamente sua energia vital. No final, entende-se que a Cor se tratava de um dispositivo de coleta de energia, emitida por extraterrestres para colher a energia de planetas e retornar posteriormente a eles.

Nesta e em outras obras Lovecraftianas, comenta-se sobre “sementes” alienígenas que se encontram adormecidas no subsolo de nosso planeta, apenas aguardando — como no caso de Cthulhu — a configuração cósmica perfeita para que possam cumprir seu intento. Em sua maioria, emitem uma energia que pode ser captada por meio de sonhos ou de viagem astral, e que influencia o inconsciente das pessoas próximas.

Imagem: A Cor que Caiu do Espaço, por Gabriel Costa.

Starcraft, Alien, Predador, Halo

Um dos elementos marcantes nas obras de Lovecraft é a luta entre raças pela soberania de planetas. Algumas raças são inteligentes, como os Antigos, ou possuem força descomunal, como Cthulhu. Outras se reproduzem e sofrem mutação muito rápido, como os Shoggoth, e os humanos se encontram em meio à guerra, podendo apenas tentar se proteger da melhor forma possível.

Este modelo de “Raça inteligente”, “Raça que se reproduz rápido” e “Humanos” se apresenta em diversos filmes e jogos posteriores, principalmente em Starcraft (Protoss, Zergs, Humanos), Alien/Predador (Predadores, Aliens, Humanos), e Halo (Covenant, The Flood, Humanos).

O mito da criação da vida terrena por raças superiores é ainda citado no filme Prometeu, e tanto neste filme quanto em Starcraft e Halo há buscas posteriores por uma raça ainda mais antiga que os próprios humanos e que as outras raças. Estes seriam os Xel’Naga, em Starcraft, e Precursors e Forerunners, em Halo. Este conceito de Criadores mais antigos também é mencionado, embora não muito explorado, nas obras de Lovecraft, com o conceito de Azathoth.

Imagem: Xel’Naga espalhando a vida pelo universo, por Blizzard Entertainment.

A Coisa

O filme “The Thing”, de John Carpenter, segue um enredo muito próximo ao de Nas Montanhas da Loucura. Neste filme, pesquisadores encontram restos mortais de uma espécie desconhecida, em meio a uma vastidão congelada. Porém, ao ser descongelada, a espécie — metamorfa como os Shoggoth — mostra que não estava morta — assim como Os Antigos. A espécie, por sua vez, almeja apenas sobreviver no planeta onde sua nave caiu.

Já “It”, de Stephen King, segue enredo análogo ao A Cor que Caiu do Céu. Um alienígena cai com sua nave no planeta Terra e passa a viver no sistema de esgoto, atraindo crianças por meio de visões e sonhos — como Cthulhu. Nestas visões e sonhos, A Coisa aparece como um palhaço, além de outras formas possíveis. O alienígena se alimenta do poder vital das pessoas, enquanto aguarda poder retornar ao Espaço.

Imagem: nave espacial do filme “The Thing” de John Carpenter.

O Segredo do Abismo e Guerra dos Mundos

No filme O Segredo do Abismo de James Cameron, cientistas descobrem uma civilização alienígena avançada no fundo de fossas submarinas a grande profundidade. Já no livro A Guerra dos Mundos, depois adaptado para o cinema, há uma grande quantidade de máquinas extraterrestres já enterradas no planeta, que são ativadas no momento desejado.

O conceito de vida extraterrestre aguardando no seio da Terra para ser descoberta ou despertada é muito explorado por Lovecraft, e o Necronomicon descreveria os locais onde estas civilizações se encontram. Os locais ficariam principalmente sob o oceano, como a ilha R’lyeh, e em regiões inóspitas como desertos ou planícies congeladas.

De acordo com Lovecraft, estes extraterrestres seriam os responsáveis pelo início do Apocalipse, quando se finalizaria um ciclo de vida orgânica no planeta para o início de outro. A data para a ocorrência, por sua vez, seria determinada por alinhamentos cósmicos específicos.

Imagem: tripods do livro “A Guerra dos Mundos” por Henrique Alvim Corrêa.

Outras referências

Muitas outras obras citam — em maior ou menor grau — conceitos Lovecraftianos. A série Stranger Things, por exemplo, apresenta em sua segunda temporada uma entidade que vive no plano astral e deseja ter acesso ao plano físico, utilizando para isso visões e sonhos. Esta entidade se assemelha muito a Nyarlathotep, citado em À Procura de Kadath.

Em uma das expansões do jogo Skyrim, por sua vez, apresenta-se um reino de geometria não euclidiana, onde vive o semideus Hermaeus Mora, incluindo tentáculos e um livro similar ao Necronomicon. Já no jogo Castlevania, o Necronomicon é utilizado em uma tentativa de reviver Drácula, o Rei dos Vampiros. Outras obras de Lovecraft foram adaptadas de forma mais direta, como é o caso do desenho animado de longa metragem “Howard Lovecraft e o Reino Congelado”, do filme “Dagon”, e do jogo “Prisoner of Ice”.

De qualquer forma, o universo Lovecraftiano é muito vasto, e o principal aspecto que perpassa suas obras é a tensão energética sempre presente na atmosfera, uma vez que há energias latentes influenciando o tempo todo em nosso mundo, em sua maioria complexas, poderosas, altamente viscerais, e potencialmente hostis.

Imagem: Pentagrama de Cthulhu por Jack-Burton25 (deviantart).

Ass.: RoYaL

Referências: Kenneth Grant — O Renascer da Magia; H.P. Lovecraft — À procura de Kadath; H.P. Lovecraft — Nas Montanhas da Loucura; H.P. Lovecraft — O Chamado de Cthulhu; H.P. Lovecraft — A cor que caiu do céu.

Cabala

Cabala Cósmica: analogias com a origem do Cosmos

AKabbalah judaica, a Qabalah hermética e a Cabala cristã surgiram na Europa, com enfoques e metodologias diferentes porém o mesmo objetivo final: estudar o surgimento do Cosmos e da vida por meio de um sistema numérico baseado em qualidades, quantidades, ordenamento e relações.

O principal símbolo do sistema cabalístico é a Árvore da Vida, contendo 10 Sephirot que são conectadas por 22 caminhos. Cada Sephira é representada por um número, e apresenta um dos aspectos do Universo. Além das 10 Sephirot, existe uma 11ª Sephira oculta, Daath, que fazia parte da Árvore da Vida no Paraíso, mas deixou de fazer após a queda de Adão e Eva.

Imagem: Árvore da Vida (após a queda), por Gabriel Costa.

Padrões e Associações

A partir da Árvore da Vida e seus caminhos, a Cabala Filosófica busca encontrar padrões e alcançar verdades escondidas por trás dos panos do Universo. Já a Cabala Prática tem como objetivo utilizar estes conhecimentos como um sistema mágico para obter os mais variados objetivos. Ao longo dos séculos, diversos estudiosos traçaram correlações e acrescentaram símbolos aos elementos da Árvore da Vida, com base em analogias e caráter dos elementos.

Estas analogias são tão consagradas que chegam a ser confundidas com o sistema cabalístico em si, e muitas pessoas começam a estudar a Cabala já associada às Arcanas Maiores do Tarot, por exemplo, em contraposição ao estudo separado inicial de cada sistema. De qualquer forma, as analogias se mostram mais do que convenientes, e o uso associado dos sistemas permite um aproveitamento muito maior do conhecimento ali contido do que o uso de cada um em separado.

Vasos de Luz

Uma das metáforas utilizadas para explicar como a luz divina permeia pelas Sephirot é a dos Vasos de Luz. A luz divina estaria, inicialmente, contida em um vaso de cerâmica, que não a conteve, tamanha a sua energia. Então, este vaso explodiu, e a luz emanou faíscas, se concentrando novamente em outro frasco, e assim sucessivamente. Os cacos dos vasos, por sua vez, teriam caído no Abismo e formado as Qliphot (fazendo parte da Árvore do Conhecimento).

Por sua vez, as teorias científicas mais aceitas atualmente sobre a origem do Cosmos — e do Planeta Terra — também se baseiam em explosões sucessivas de energia, alternadas com períodos de concentração e atração gravitacional. Passo a passo, a natureza vai alcançando formas mais estáveis, como o elemento Ferro, que possui a maior estabilidade nuclear na tabela periódica (e por isso é abundante na Terra e em outros planetas).

A Jornada do Cosmos

Segundo as teorias científicas mais aceitas atualmente, as etapas que foram seguidas pela natureza desde a formação do Universo até o surgimento do Planeta Terra foram as seguintes:

1. Big Bang: a teoria do Big Bang se baseia na ideia de que o Universo estava, em seus primeiros momentos, concentrado em um ponto ínfimo, que continha toda a massa existente, e possuía grandes quantidades de energia. Então, este ponto teria sofrido uma rápida expansão, e a matéria e a luz teriam sido espalhadas — e ainda estariam se movendo para as fronteiras do Espaço — formando o Universo.

Imagem: Big Bang, pixelparticle/iStock.

Na Cabala Judaica, existe um conceito similar, o TzimTzum, que seria um espaço que Deus teria formado dentro de si para permitir o surgimento de matéria. Esta descontinuidade estaria concentrada inicialmente em um ponto e depois poderia se expandir, e permitiria que surgisse um Universo Finito dentro da infinitude de Deus.

2. Quasares: após o Big Bang, um dos primeiros tipos de entes cósmicos formados seriam os Quasares — Objetos Quase Estelares. Os Quasares são grandes concentrações de matéria e energia orbitando em torno de buracos negros, formando um disco de acreção que emite energia e brilho intenso, além de ondas de rádio, entre outras frequências de radiação. Muitos Quasares estão posicionados no centro de galáxias, principalmente aquelas com alta taxa de nascimento de estrelas, ou galáxias que estão se mesclando.

3. Explosão de Quasares: devido ao consumo de matéria e energia pelos buracos negros supermassivos que há no interior dos Quasares, é possível que em algum momento haja seu colapso. Nesta ocasião, são formadas novas estrelas, mais estáveis porém ainda muito energéticas, além de nuvens gasosas, asteróides e agregados de matéria.

4. Estrelas: as estrelas são formadas por grandes quantidades de plasma que se mantêm unidas devido à sua própria gravidade. Podem possuir diferentes níveis energéticos e diferentes intensidades de emissão luminosa, e em seu interior diversos elementos químicos se recombinam e formam novos elementos.

Imagem: Estrelas na Nuvem Magelânica, European Space Agency.

5. Supernovas: quando uma estrela com alta energia começa a formar elementos estáveis, como o Ferro, as forças liberadas nas reações nucleares em seu interior começam a alcançar valores menores do que as forças gravitacionais que mantêm sua integridade. Neste momento, as estrelas colapsam em eventos conhecidos como Supernovas, formando estrelas menores e planetas, além de outros agregados de matéria.

6. O Sol: o Sol, estrela central do Sistema Solar, foi formado há cerca de 4,6 bilhões de anos a partir de uma Supernova, junto a outros corpos celestes. É uma estrela anã que emite brilho na cor branca (embora este brilho seja visto como amarelo a avermelhado devido à atmosfera terrestre).

7. Planetas: junto à formação do Sol, foram gerados os planetas e outros corpos que orbitam em torno dele e formam o Sistema Solar. Os Planetas já não possuem energia suficiente para manter uma reação nuclear ativa, principalmente devido a possuírem elementos mais estáveis, portanto se consolidam como um agregado de matéria unido por forças gravitacionais. As substâncias que formam cada planeta são diferentes, o que confere a cada um características específicas, como cor, emissão de radiações e absorção de frequências.

8. Big Splash: há aproximadamente 4,5 bilhões de anos, um dos planetas que orbitava em torno do Sol teria sido atingido por um asteroide com o tamanho aproximado de Marte. Durante a colisão, teria havido intercâmbio entre os elementos presentes tanto no planeta quanto no asteroide, e parte da matéria teria ainda sido expulsa para o Espaço. Assim, formaram-se (segundo esta teoria), o Planeta Terra e seu satélite natural, a Lua.

Imagem: Big Splash, Extreme Tech.

9. A Lua: provavelmente formada no Big Splash, a Lua serviu desde então como um vetor de mudança no Planeta Terra que também havia se formado neste mesmo evento. Seu campo gravitacional age atraindo massas de fluidos, e o movimento das marés pode ter sido um dos responsáveis por formar poças primordiais quentes e isoladas, onde os elementos químicos se recombinariam sem que ficassem dispersos pelo Oceano, dando origem à Vida.

10. A Terra: após o Big Splash, a maior massa de matéria, incandescente, foi tomando forma e os elementos foram se organizando por ordem de densidade até formar um núcleo, um manto e uma crosta, além de massa aquática e atmosfera. A água fornece um meio fluido com alta mobilidade para que os elementos se recombinem, e as rochas possuem minerais que podem catalisar reações e fazer com que estas ocorram mais rápido. Estes elementos, em conjunto com as radiações ultravioletas que a superfície terrestre recebia antes da formação da camada de Ozônio, os altos teores de amônia e gás carbônico na atmosfera, além de outros fatores presentes na Terra primitiva, teriam permitido o surgimento da Vida.

A teoria de Oparin quanto ao surgimento da Vida por meio de reações químicas na Terra primitiva é a que possui maior confirmação científica atualmente. Em 1952, o Experimento de Miller-Urey confirmou essa possibilidade, quando mostrou ser possível sintetizarem-se aminoácidos a partir de substâncias simples e condições experimentais severas, que mimetizavam os anos iniciais do Planeta.

11. Buracos Negros: os conhecimentos sobre Buracos Negros são ainda escassos, e as discussões ocorrem em sua maioria no campo teórico, porém sua existência possui muitos indícios experimentais. Os Buracos Negros consistem em agregados de matéria com tamanha gravidade que conseguem absorver até mesmo fótons de luz, e portanto não podem ser visualizados diretamente, sendo verificados por meio de seu efeito nas vizinhanças. De qualquer forma, são os principais candidatos a corpos centrais em muitas das galáxias conhecidas, indicando que seriam os responsáveis por gerar a organização atual do Cosmos em que vivemos.

Além dos buracos negros, outros corpos celestes não são visíveis, e sua presença é percebida principalmente pelo comportamento de sua vizinhança. Sírius, por exemplo, é um sistema binário composto por duas estrelas, das quais apenas uma continua visível (Sírius A), uma vez que a outra (Sírius B) passou a emitir muito menos luz ao longo dos anos. Sírius B, muito mais massiva que Sírus A, seria o Sol Negro, que teve grande influência no movimento do Sistema Solar até ser consumido pelas próprias reações nucleares e perder seu brilho.

Imagem: Cabala Cósmica, por Gabriel Costa.

Sendo assim, percebe-se que há analogia entre a sequência de repulsões (pilar da severidade) e atrações (pilar da misericórdia) relacionadas ao surgimento da Terra, e a evolução das energias na Cabala, que é explicada em detalhes no Zohar. No pilar do equilíbrio, encontram-se os corpos que se estabilizaram nestes processos, e que ainda exercem influência sobre os Humanos.

Calendários

A Lua orbita em torno da Terra, que por sua vez orbita em torno do Sol, que está em um dos braços da Via Láctea, que pertence ao superaglomerado de galáxias Laniakea. Como as órbitas possuem uma estrutura bem organizada, podem ser utilizadas para marcar o tempo, e de fato isso foi feito pelos Humanos ao longo dos séculos.

Os principais calendários conhecidos são o Lunar — baseado na órbita da Lua em torno da Terra, que dura cerca de 29 dias — e o Solar — baseado na órbita da Terra em torno do Sol, que dura cerca de 365 dias. Porém, alguns povos desenvolveram ou herdaram outros tipos de calendário, como é o caso do Calendário Sótico, conhecido pelos Dogon (povo da África Subsaariana) e pelos Egípcios. Este calendário se baseia no retorno de Sírius (em grego, Sothis) à mesma posição relativa ao Sol, o que ocorre a cada 1.461 anos, aproximadamente.

Assim na Terra como no Céu

Cabe ressaltar que este ensaio não tem como objetivo inferir sobre os conhecimentos cosmológicos que a Humanidade já possuía antes da Ciência registrá-los formalmente — após terem sido perdidos na Idade das Trevas. Porém, se tudo o que está em cima é como o que está embaixo, percebe-se que os caminhos observados pelos cabalistas na transcendência individual possuem forte correspondência com os caminhos tomados pela natureza em sua jornada de evolução.

Imagem: composição de bandas de frequência na Nebulosa do Caranguejo — NASA et al., 2017.

Ass.: RoYaL.

Referências: Qabalah, Qliphoth and Goetic Magic — Thomas Karlsson; Uma breve história do tempo — Stephen Hawking; Kenneth Grant — O Renascer da Magia.

Tecnomagia

Física Quântica tem a ver com ocultismo?

A física quântica enquanto ciência exata só aceita o que pode ser QUANTIFICADO — calculado ou medido — pelos métodos existentes. Além disso, considera que a energia não é contínua, e funciona em pequenos pacotes chamados QUANTA. Porém, a física quântica mencionada em diversas correntes de ocultismo possui algumas ANALOGIAS com a física quântica científica, derivando suposições e extrapolações de alguns dados que foram — estes sim — comprovados cientificamente.

Princípio da incerteza

O princípio da incerteza, atribuído a Heisenberg, afirma que é impossível observar a posição de algum corpo sem interferir em sua energia, ou medir sua energia sem interferir em sua posição. O produto dos erros de medição é sempre maior ou igual a h/4pi.

Isso nos leva a uma conclusão importante: a medição SEMPRE interfere no sistema. Isso leva à hipótese de que mesmo a intenção de se fazer alguma medição pode interferir no sistema, ou seja: interferir na matéria com o poder da mente.

Imagem: representação da incerteza de Heisenberg — Maschen

Energia quantizada

A energia não é contínua, é quantizada. Isso significa que um corpo não absorve qualquer quantidade de energia, apenas aquelas quantidades corretas que permitem que ele dê um salto para outro estado. Consequentemente, para que um corpo absorva uma vibração, ele deve “estar vibrando na mesma frequência”, ou pelo menos possuir modos de vibração com energias adequadas.

Isso permite a existência de vários mundos ou dimensões no mesmo local, e um não interfere no outro porque eles vibram em frequências diferentes. Também é a base da lei da atração: só atraímos e absorvemos energia quando vibramos na frequência dela. Se vibrarmos em uma outra frequência, vamos absorver essa outra energia.

Dualidade partícula-onda

Foi realizado um experimento passando elétrons por uma placa com duas fendas. Quando não se usava um detector para saber por qual das duas o elétron passou, era obtido um resultado que mostrava que o elétron se comportou como uma onda (como a luz). Porém, quando usava-se um detector, o elétron só passava por uma ou por outra fenda, como uma partícula.

Neste caso, há quem defenda que a intenção de medir interferiu no sistema. Porém, há quem defenda que o medidor que foi usado interferiu no sistema, fazendo o elétron se comportar de forma diferente.

Degenerescência

O caso do elétron é observado em vários sistemas quânticos. Quando não estão sendo medidos ou observados, eles possuem degenerescência: comportam-se de várias formas, e sua energia na verdade é uma média ponderada das energias de cada forma. Quando o sistema é medido ou observado, decai para uma das formas possíveis (apenas onda ou apenas partícula, por exemplo).

Isso dá suporte à teoria do Caoísmo: tudo é caos por trás dos panos, e quando tentamos observar só vemos uma das formas possíveis. A energia Babalon é considerada em diferentes momentos como Virgem ou Prostituta, mas é as duas, nenhuma delas, e muito mais que isso, ao mesmo tempo.

Imagem: degenerescência de orbitais moleculares — W.W. Norton.

Tudo é vibração

Pelo princípio da incerteza, há um limite de exatidão na nossa observação do mundo. Porém, em sistemas maiores e mais pesados, a incerteza acaba sendo desprezível perto do tamanho do sistema, e o sistema quântico se comporta como um sistema clássico. Mesmo assim, as coisas não deixam de ser vibração — são apenas formas mais densas de vibração.

Tunelamento

Também pelo princípio da incerteza, elétrons não possuem “posição”. Eles são uma nuvem (distribuição de probabilidades), e não estão rodando, apenas SÃO. Isso faz com que um átomo encostado em uma parede possa ter seus elétrons atravessando a mesma; a nuvem correspondente aos elétrons não precisou passar pela parede, pois ela não possui posição! Sendo assim, elétrons atravessam paredes, e isso pode ser usado para enviar vibrações à distância. Se um espírito é feito de elétrons ou energias tão sutis quanto eles, ele pode atravessar as paredes. E pode guardar muita informação, como por exemplo a informação de um cérebro humano inteiro — sendo então uma entidade “consciente”.

Partícula/antipartícula

Verifica-se que as energias podem virar matéria e vice-versa, e uma energia disforme no vácuo pode momentaneamente tomar a forma de duas partículas opostas que depois irão colidir e sumir. De fato, no vácuo pulam o tempo todo pares de quark/antiquark, que depois se aniquilam. Isso dá sustentação à possibilidade de se materializar coisas a partir do nada — bastaria formar quarks suficientes para formar prótons, átomos, moléculas, etc.

Além de isso ser extremamente difícil, os antiquarks têm que ser descartados de alguma forma, então tem que ser fornecido algo em troca, para eles se aniquilarem e o universo reencontrar seu equilíbrio.

Entrelaçamento Quântico

Outro fenômeno quântico interessante é o fato de elétrons que estavam em um mesmo orbital só poderem ter spins opostos. Nesse caso, se os elétrons forem separados, e o spin de um deles for trocado, o outro irá inverter seu spin da mesma forma instantaneamente, em uma comunicação mais rápida que a velocidade da luz — isso é também chamado Efeito Fantasmagórico à Distância, pois nada é enviado de um elétron para o outro para que o fenômeno ocorra.

Esta seria a base da telepatia, e já está sendo a base dos computadores quânticos.

Imagem: Telepatia — Brit Lab

Ass.: RoYaL.

Referências: Dr. Massimo Citro – O código básico do universo; Fritjof Capra – O Tao da física; Stephen Hawking – O universo em casca de noz; Stephen Hawking – Uma breve história do tempo; Donald A. McQuarrie – Química Quântica; Ira N. Levine – Química Quântica; Vitor Oguri e Francisco Caruso – Física Moderna: Origens Clássicas.

Tecnomagia

Equações Mágicas

Empirismo é uma prática científica com foco na análise de resultados. As fórmulas empíricas buscam representar satisfatoriamente os resultados de um experimento, no intuito de estimarem-se os valores que ocorreriam em situações mais gerais. Com base nos resultados de experimentos variando, por exemplo, pressão e temperatura, podem ser construídas equações que permitem prever os resultados para qualquer pressão e para qualquer temperatura dentro da faixa estudada.

De forma geral, a construção de equações empíricas se inicia entendendo-se os efeitos observados de uma ou mais variáveis sobre as outras. Quando se aumenta o valor de uma variável, as outras podem aumentar ou diminuir, de forma linear ou exponencial, ou ainda oscilar, tendendo ou não a um valor de equilíbrio. Da mesma forma, as equações permitem observar situações impossíveis, que levariam a valores inválidos de uma ou outra variável.

Imagem: exemplos de funcionalidade entre variáveis — por Gabriel Costa.

Em alguns de seus trabalhos, Peter J. Carrol aliou os conceitos do Caoísmo e da Magia do Caos ao rigor matemático das equações empíricas, propondo um estudo algébrico das práticas mágicas e seus resultados. Os principais trabalhos publicados por Carroll que possuem análises nesse sentido são Liber KaosPsyberMagick e The Octavo.

As equações utilizam variáveis para representar aspectos subjetivos, que são convertidos para valores numéricos a partir de uma análise de seu nível ou de sua grandeza. Por exemplo, o “nível de gnose” no qual uma pessoa se encontra pode estar em um intervalo de 0 a 1. Sendo assim, entende-se que o valor 0 seria um estado “totalmente desperto” (sem nenhum nível de gnose), e o valor 1 seria uma “gnose profunda” (em um estado totalmente não dual). A análise dos valores intermediários, por sua vez, depende da interpretação do magista, com base em seus conhecimentos e suas percepções sobre as próprias práticas e rituais.

Equação 1 — Fator Mágico

O fator mágico M representa o poder de um ato mágico, com base nos fatores que estão envolvidos em um ritual, tanto em relação ao magista quanto em relação à prática. Este fator mágico influencia na probabilidade de um objetivo se concretizar, assim como em sua eficácia, e varia entre 0 (poder mágico nulo) e 1 (poder mágico máximo).

M = G L (1-A) (1-R)

  • G é o nível de gnose, que influencia positivamente no fator mágico. Quanto maior o estado de não dualidade do magista no momento da realização do ritual, ou seja, seu desprendimento do plano físico, maior o fator mágico.
  • L é a ligação mágica entre o magista e o alvo da magia. Quanto mais próximo o magista for do alvo, a nível mental, sentimental ou mesmo de convivência cotidiana, maior será o fator mágico. A conexão pode ser auxiliada por um objeto relacionado ao alvo, ou um fetiche que o represente.
  • A é a atenção do magista a nível consciente. Como a magia opera a nível inconsciente, a atenção consciente deve ser diminuída ao máximo, uma vez que tende a diminuir o fator mágico.
  • R é a resistência inconsciente do magista. Esta resistência deve ser diminuída, uma vez que reduz o fator mágico. Ela ocorre porque, atualmente, a maioria das pessoas é educada em um sistema puramente científico, sendo ensinada que “magia não funciona”. Sendo assim, o Censor Psíquico atua como um bloqueador do efeito mágico, e sua atuação deve ser controlada pelo magista mediante treino e estudo.

Todos os parâmetros G, L, A e R variam entre 0 e 1.

Imagem: gráfico representando o fator mágico M (eixo vertical) em função de R (eixo de base, inferior) e G (eixo de base, à direita) — por Gabriel Costa.

Equação 2 — Probabilidade Mágica (positiva)

A probabilidade mágica Pm representa a probabilidade de que algum objetivo ocorra, caso seja utilizada magia visando este evento. Está relacionada não só ao fator mágico, ativado por meio do ritual realizado pelo magista, mas também à probabilidade de que o evento ocorra naturalmente, sem interferência do ritual.

Pm = P + (1-P).M^(1/P)

  • P é a probabilidade natural de que o evento ocorra, sem a influência da magia. Sendo assim, percebe-se que a magia aumenta a probabilidade para um valor Pm, maior que P.
  • M é o próprio fator mágico calculado anteriormente. Caso não seja feito nenhum ritual relacionado ao objetivo, M será igual a zero, e a probabilidade mágica será simplesmente igual à probabilidade normal de ocorrência.

Como toda probabilidade, P está entre 0 e 1 (ou seja, de 0% a 100%). Ressalte-se que o valor de P pode tender a zero, porém nunca ser igual a zero, o que levaria a uma divisão por zero e a uma indefinição. Na prática, isso pode ser relacionado à incapacidade de se obter intuitos impossíveis. Porém, é possível aplicar a magia para conseguir objetivos muito improváveis.

Imagem: gráfico representando a probabilidade mágica Pm (eixo vertical) em função de M (eixo de base, inferior) e P (eixo de base, à direita), quando se deseja incentivar ou atrair o evento — por Gabriel Costa.

Equação 3 — Probabilidade Mágica (negativa)

Porém, a probabilidade mágica Pm também pode representar a probabilidade de que algum objetivo ocorra, caso seja utilizada magia para evitar este evento. Neste caso, a probabilidade de ocorrência é reduzida em relação à probabilidade natural, por meio do uso da magia.

Pm = P – P.M^[1/(1-P)]

  • P é a probabilidade natural de que o evento ocorra, sem a influência da magia. Sendo assim, percebe-se que a magia diminui a probabilidade para um valor Pm, menor que P.
  • M é o próprio fator mágico calculado anteriormente. Caso não seja feito nenhum ritual relacionado ao objetivo, M será igual a zero, e a probabilidade mágica será simplesmente igual à probabilidade normal de ocorrência.

Como toda probabilidade, P está entre 0 e 1 (ou seja, de 0% a 100%). Ressalte-se que o valor de P pode tender a um, porém nunca ser igual a um, o que levaria a uma divisão por zero e a uma indefinição. Na prática, isso pode ser relacionado à incapacidade de se impedir eventos já confirmados. Porém, é possível aplicar a magia para conseguir impedir a ocorrência de eventos muito prováveis.

Imagem: gráfico representando a probabilidade mágica Pm (eixo vertical) em função de M (eixo de base, inferior) e P (eixo de base, à direita), quando se deseja repelir ou evitar o evento — por Gabriel Costa.

Equação 4 — O uso de Entidades

A probabilidade de que um objetivo seja alcançado utilizando Entidades varia de acordo com a probabilidade natural de ocorrência do evento, e com o nível de ligação entre o magista e a entidade.

No livro Psybermagick, esta equação é apresentada por Carroll em relação ao uso de Eidolons (ou servidores), principalmente os Cybermorfos (com formas tecnológicas). Porém, de forma mais geral, poderia ser aplicada a Daemons da Goécia, elementais naturais, elementais artificiais (que eram criados na Golden Dawn e se assemelham muito a servidores), entre outras entidades.

Pe = P + (1-P).L^(1/P)

  • P é a probabilidade natural de que o evento ocorra, sem a influência da magia. Sendo assim, percebe-se que o uso de entidades aumenta a probabilidade para um valor Pe, maior que P.
  • L é a qualidade da ligação entre o magista e a entidade. Caso não seja utilizada nenhuma entidade para realizar aquele objetivo, ou o magista não consiga realizar ligação alguma com a entidade, L será igual a zero, e haverá probabilidade normal de ocorrência.

Como toda probabilidade, P está entre 0 e 1 (ou seja, de 0% a 100%), e L também está entre 0 e 1. Ressalte-se que o valor de P pode tender a zero, porém nunca ser igual a zero, o que levaria a uma divisão por zero e a uma indefinição. Na prática, isso pode ser relacionado à incapacidade de se obter intuitos impossíveis. Porém, é possível utilizar entidades para conseguir objetivos muito improváveis.

Imagem: gráfico representando a probabilidade de que algo seja alcançado utilizando-se entidades Pe (eixo vertical) em função de L (eixo de base, inferior) e P (eixo de base, à direita) — por Gabriel Costa.

Equação 5 — A Magia no Espaço-Tempo

Nesta equação, o tempo e o espaço são entendidos como dois domínios por onde a magia pode fluir. Neste caso, a magia flui por um plano imaginário composto por duas dimensões temporais, além do eixo de tempo normal, e do espaço tridimensional já conhecido. Sendo assim, o espaço-tempo adquire seis dimensões (x, y e z, contidos em s, além de t, a e b). Todas as dimensões formam uma hiper-esfera.

s² + (ict)² + (i²ca)² + (i²cb)² = 0

  • s é a separação espacial entre o magista e a magia conjurada (contém x, y e z, sendo igual à raiz da soma de seus quadrados).
  • t é a separação temporal entre o magista e a magia conjurada.
  • a e b são as separações temporais imaginárias entre o magista e a magia conjurada, em um espaço temporal imaginário com duas dimensões.
  • i é a raiz de -1.
  • c é a velocidade da luz.
Imagem: emanações a partir de uma magia conjurada por um magista posicionado na origem, no tempo t0. As unidades dos eixos são segundos/luz, e os tempos t1, t2 e t3 são de 0,4 segundo, 0,7 segundo e 1 segundo, respectivamente — por Gabriel Costa.

Segundo esta equação, a magia é capaz de fluir em todas as dimensões, incluindo a direção negativa do tempo, e as realidades paralelas, que seriam duas dimensões adicionais imaginárias do tempo.

Um dos exemplos de aplicação disso é a possibilidade do uso de magias retroativas. Neste caso, o magista pode lançar uma magia no tempo “-1”, que se moverá à velocidade da luz e poderá operar no passado, inclusive afetando algum evento que ocorre no momento atual, em que o magista está fazendo o ritual, ou afetando algum evento que já ocorreu, “mudando o passado”. Isto também se aplica a oráculos, quando são adivinhados eventos que aconteceram em tempos negativos em relação ao momento do ritual.

Outro exemplo de aplicação é a visita a realidades paralelas, no plano “ab”, que é transversal ao eixo de tempo t. Se os eventos do passado tivessem sido alterados, ou ocorressem de forma diferente, surgiriam outras linhas do tempo, formando uma grande região bidimensional de possibilidades em torno do magista no instante t0. Assim, o magista pode visitar ou vislumbrar estas realidades paralelas, bastando para isso utilizar skrying ou projeção astral.

Outras Equações

No livro “The Octavo”, Carroll apresenta diversas magias em forma algébrica, utilizando equações científicas e propondo, com base nelas, explicações dos efeitos mágicos, e do próprio funcionamento do universo.

Imagem: ilusões como resultado da distorção das ondas luminosas (Livro The Octavo, por Peter Carroll).

Neste grimório, magias de atração são explicadas em relação às leis da gravitação, as magias de manutenção e de ciclos são explicadas com base nas leis físicas de vórtices, e as leis da entropia servem de base para explicar probabilidades mágicas de realizar feitos improváveis.

Imagem: hipercubo (Livro The Octavo, por Peter Carroll).

Por que Equações Mágicas?

De fato, equações mágicas serão necessárias quando for realizada a unificação entre ciência e magia, em um futuro não muito distante. Quando forem desenvolvidos equipamentos para mensurar energias sutis, e os métodos atuais (como a psicometria, a radiônica e a fotografia Kirlian) forem aprimorados e tiverem maior crédito, será possível a realização de experimentos em larga escala, e as equações mágicas poderão ser confirmadas, refutadas ou adaptadas.

Como magia é probabilística (assim como a mecânica quântica), para comprová-la cientificamente seriam necessários milhares de experimentos, com controle rígido das variáveis envolvidas. A comunicação dos resultados deverá ser ampla e abrangente na comunidade mágica internacional, e deverão ser criadas métricas e métodos para quantificação correta das variáveis (duas pessoas não deveriam ter duas métricas muito diferentes quanto a seus próprios níveis de Gnose (G), por exemplo).

Imagem: fotografia Kirlian de folhas, por Walter Myers.

Porém, até lá, é certo que a ciência não possui papel de validar a magia, ou que se trata de algo superior. São apenas dois campos de estudo, com diferentes metodologias e dinâmicas. Este juízo de valor é geralmente aplicado por pessoas céticas, que se esquecem que, até pouco tempo, a eletricidade era considerada um fenômeno paranormal, e a dualidade partícula-onda era uma aberração. Esta mesma comunidade ainda considera, em parte, o tunelamento e a não localidade como efeitos “fantasmagóricos”, mesmo ambos sendo verificados teórica e experimentalmente.

A Ciência está mudando, e o caminho é na direção de um conhecimento menos baseado em dualidades rígidas, e mais baseado em probabilidades e degenerescência (dualidades condicionais). Neste novo Aeon, a Magia certamente terá um papel de destaque, e poderá ser tratada como a Ciência.

Ou vice-versa.

Ass.: RoYaL

Referências: Peter Carroll (1987) — Liber Null e Psiconauta; Peter Carroll (1992) — Liber Kaos; Peter Carroll (1996) — PsyberMagick; Peter Carroll (2011) — The Octavo.

Oráculos

Tarot, história e estrutura

Existem poucas informações confiáveis sobre a verdadeira origem do Tarot. Alguns autores têm tentado encontrar referências de forma histórica, recorrendo o mínimo possível a associações e extrapolações (ato de aplicar o mesmo raciocínio a algo fora do espectro de informações comprovadamente verdadeiras), e mesmo assim ainda há incerteza quanto às origens ciganas, ou mesmo egípcias, desta prática oracular baseada em cartas.

Imagens: Drag Tarot, por Gabriel Costa.

O Tarot de Marselha

Após extensa pesquisa, Nei Naiff concluiu que o Tarot de Marselha, na estrutura mais conhecida hoje, teve sua primeira documentação comprovada no início do século XIII, na forma de um conjunto de placas chamadas Naibis, que eram utilizadas para jogos, aprendizado e contação de histórias, e posteriormente vieram a ter aplicação psicanalítica, oracular e divinatória. Da palavra Naibis, inclusive, teria surgido a definição dos Naipes que são usados até hoje, ou Arcanas Menores. Os Trunfos ou Arcanas Maiores seriam adições posteriores, e se tornaram instrumento para análises relacionadas a questões mais gerais e que influenciam vários campos da vida. A estrutura mais conhecida do Tarot de Marselha possui 78 cartas, sendo 22 Arcanas Maiores e 56 Arcanas Menores.

Imagens: Drag Tarot, por Gabriel Costa.

As Arcanas Maiores

As Arcanas Maiores representam tendências que influem em vários campos da vida, e sua ordem apresenta uma jornada, desde o potencial infinito do Louco, passando pela decisão de qual caminho tomar com o Mago, culminando na obtenção de tudo o que se deseja com o Mundo, e retornando ao Louco no campo das ideias para se regenerar e pensar em uma nova jornada.

Imagens: Drag Tarot, por Gabriel Costa.

As Arcanas Menores

Já as Arcanas Menores possuem as cartas Ás, que são os elementos mentais surgindo em sua forma mais pura, as cartas numeradas de 2 a 10, que representam a jornada através daquele elemento, e as cartas de côrte, que representam os estágios pelos quais uma pessoa passa em sua jornada, manifestando aquele elemento. As adagas (espadas) são geralmente associadas ao Ar, à razão e ao pensamento. Já as taças (copas) são relacionadas à Água, às emoções e ao sentimento. As moedas ou pentáculos (ouros) são relacionados à Terra, aos bens materiais e à sensação física, e os bastões (paus) são relacionados ao Fogo, ao espírito e à intuição. Alguns autores apresentam correlações diferentes a estas para os naipes (principalmente quanto à inversão entre espadas e paus), e alguns baralhos alteram a ordem de algumas Arcanas Maiores, o que influencia a técnica de leitura.

Imagens: Drag Tarot, por Gabriel Costa.

Relação com outros sistemas

Outros símbolos podem estar relacionados a cada carta, como letras hebraicas, figuras mitológicas ou símbolos astrológicos, porém estas adições são realizadas por associação ou proximidade, e não fazem parte da estrutura intrínseca ao Tarot. Os elementos que fazem parte originalmente do sistema do Tarot são, apenas, os aspectos medievais que se apresentam nas cartas desde sua criação e consolidação como um sistema completo.

Imagem: cartas do Tarot Mitológico por Liz Greene e Juliet Sharman-Burke.

Ass.: RoYaL.

Referência: Nei Naiff — Tarô: simbologia e ocultismo.

Oráculos

Métodos divinatórios: teoria geral e exemplos

A divinação é definida como a prática de adivinhar ou vislumbrar informações não conhecidas de forma consciente pelo praticante. Estas informações podem provir de várias fontes, desde o inconsciente do próprio magista, ou seja, informações que o próprio já havia captado mas não tinha conhecimento disso de forma consciente, até egrégoras que estão no plano etérico e são lidas por meio do método divinatório.

Os métodos divinatórios podem propiciar, também, um encadeamento de informações que já são conhecidas, permitindo realizar projeções sobre o que vai acontecer no futuro. De qualquer forma, na maioria dos métodos de divinação não é necessário definir de onde vieram as informações, focando-se apenas nas formas de canalizá-las para a mente consciente.

Aleatoriedade e Interpretação

Os dois aspectos mais importantes dos métodos divinatórios são, de forma geral, o fator aleatoriedade, que permite que os resultados sejam afetados por energias sutis como as egrégoras e os elementos inconscientes já adquiridos pelo leitor, e o fator interpretativo, que consiste na habilidade do consultor de traduzir os resultados do método para a linguagem humana, seja para entender na prática o que está sendo dito, ou para explicar a outrem.

No que toca aos métodos em si, estes geralmente possuem “casas” e “elementos”. As “casas” são regiões espaciais que representam diferentes atores em uma situação, setores da vida, ou contextos, onde os “elementos” podem cair, formando diversas combinações que seriam os resultados possíveis.

Imagem: jogo de Búzios — Centro Cultural Ifá-Aje

Métodos de Tiragem

Quando se faz um jogo sorteando três cartas do Tarot, três cartas ciganas ou três runas, por exemplo, deve-se primeiramente definir o que representam as três “casas” onde os elementos podem aparecer. Existem métodos onde as três casas representam aspectos gerais de uma situação ou uma pessoa, mas as três casas também podem representar passado, presente e futuro, ou então início, meio e fim de um dia, de uma semana, ou de um ciclo. Os “elementos”, por sua vez, irão aparecer nestas casas, e nestes três sistemas divinatórios, especificamente, não pode haver repetição, uma vez que as cartas e as runas que já saíram não são retornadas para um novo sorteio.

Há ainda a possibilidade de se usar mais casas, como no método da cruz celta, com 10 casas representando a situação do consulente, o que está impedindo ele no momento, o que está influenciando a situação por cima, o que está oculto sob a situação, o passado, o futuro, o papel do consulente, o papel dos outros à sua volta, os medos e preocupações, e o resultado final.

Imagem: método da Cruz Celta — Antonio Carrasco

O iChing

Já no iChing, há 4 possibilidades de elementos: linha Yin fixa, linha Yin mutável, linha Yang fixa, linha Yang mutável, que podem surgir em 6 casas, formando um hexagrama com ou sem mutações. Já na divinação por mapas astrais, os planetas representam os campos ou setores da vida (podendo ser entendidos como as “casas”, nesta classificação geral), e podem estar em 12 diferentes signos, que seriam os elementos a serem interpretados em cada contexto.

Imagem: trigramas do iChing — Constantino Riemma

Outros métodos

No caso dos métodos divinatórios que utilizam tiragens livres ou relações espaciais, as “casas” onde os elementos podem ser apresentar seriam as posições no espaço de análise. As tiragens são interpretadas em termos de quadrantes, posições central, direita, esquerda, acima e abaixo, ou direções Norte, Sul, Leste, Oeste. No jogo de Búzios e na adivinhação com ossos, a análise dos quadrantes é ainda aliada à visibilidade ou não da abertura de ou rachaduras nos elementos do jogo.

Interpretações detalhadas

Além das interpretações básicas, existem ainda interpretações que utilizam combinações ou critérios de posições relativas entre os elementos. No caso dos métodos que usam elementos posicionados aleatoriamente no espaço de leitura, os elementos podem formar desenhos, como é o caso da leitura de borra de café, sombras, nuvens ou fogo.

No caso dos mapas astrais, há triangulação entre planetas, entre outras conjunções. Já no caso do Tarot, a predominância de um naipe ou de arcanas maiores com um mesmo caráter pode ter significação especial.

Combinações possíveis

Quanto mais elementos e casas, mais combinações possíveis para os métodos de leitura. Por outro lado, mais restritas são as interpretações dos elementos. Por exemplo, todas as situações que poderiam acontecer na vida de uma pessoa estão resumidas nas 78 cartas do Tarot de Marselha, mas no Futhark estas situações estão resumidas em 24 runas.

Sendo assim, de forma geral, é natural que cada runa englobe um maior volume de significados do que cada carta do Tarot. Desta forma, a interpretação é mais complexa quanto menos possibilidades de resultados final houver no método.

Ass .: RoYaL.